terça-feira, dezembro 05, 2006

Tollitur quaestio

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Last man standing

Soa o gongo, e mais uma vez os dois competidores se levantam. Ambos batem os punhos cobertos por luvas, como um sinal de respeito mútuo, voluntário. Ambos resistiram até aquele último assalto, e se admiraram por isso. A dor nos braços, que eles não mais conseguiam erguer em uma boa defesa, era apenas pouco menor que a dor em seu tronco, costelas, e também em seu rosto.

Desferem golpes, socos: verdadeiros coices, mesmo naquela altura da luta. Trocam pancadas, mas nenhum dos dois cai, apenas sente a dor de impactos sobrepostos sobre os músculos. Ouvem-se os golpes atingindo, secos, carne e ossos. Golpes, golpes, o tempo não parece correr, e mesmo assim eles correm contra ele. Cada um precisa saber que ficará com o cinturão ao final da luta, não podem deixar a decisão para os juízes, não após todo aquele esforço.

SOCO! E o lutador sabe naquele momento que seu queixo está quebrado, mas permanece feroz, e desfere respostas à altura de seu adversário. Soco, Soco! E ambos caem, de cansaço e pelos impactos que receberam. O público é tomado por um delírio frenético, gritando e pulando, cada torcedor pedindo a seu lutador que se levante. E, ambos começam a se mover, em um esforço desmedido. Sete! A contagem a seu final, e eles desesperadamente buscam forças para vencer seus próprios limites. Oito! (...)

Tortura

- Conte-me. – disse, calmo e ameaçador, o homem ao prisioneiro

Acorrentado a uma mesa, com seus braços e pernas afastados uns dos outros, e embora apavorado, ele disse, com a voz trêmula, mas decidido:

- Você não vai conseguir arrancar nada de mim.

O homem riu, sadicamente, assim como os demais ao redor. Segurando uma faca cega e enferrujada, próxima ao rosto do prisioneiro, ele disse:

- Ah, mas eu vou arrancar coisas de você. Algumas coisas. E depois vou mostrá-las a você. Você vai gritar, em dor. O tipo de dor que fará você questionar a existência de Deus. E, então, quando eu estiver satisfeito, você poderá falar alguma coisa.

O homem começou a tremer, notadamente, frente a seu carrasco.
(...)

Nova Fábula


Naquela pequena vila no interior, havia uma casa na qual competiam sempre por espaço um rato, um gato e um cachorro, e nenhum deles conseguia se livrar dos demais. Foi quando, um dia, o dono da casa comprou uma cobra da loja de animais e a colocou em uma caixa fechada, na sala. Os outros três animais, sem saber o que havia dentro da caixa, mas, sabendo que era outro animal que chegava, ficaram curiosos. Não demorou muito até que o cachorro parasse ao lado da caixa para perguntar:
- Quem está aí dentro?
- Uma amiga.
- Não minha. Nem a conheço.
- Não seja assim. Abra a caixa, vamos conversar.
- Não. Quando meu dono quiser soltar você, ele mesmo irá abrir a caixa. É assim que as coisas funcionam por aqui. Até lá, boa sorte.
E o cachorro deixou a cena, observada pelo gato, que se aproximou em seguida:
- Quem está na caixa, vamos, fale a verdade.
- Como eu disse: uma amiga.
- Não uma amiga minha, que nem mesmo vi seu rosto.
- Você não tem nem mesmo a curiosidade de descobrir?
- Já aprendi essa lição por um primo meu. Agora eu sou cauteloso.
- Abra a caixa, por favor. É horrível ser uma prisioneira, quero estar livre e conviver com vocês.
- Se você fosse um animal para estar livre, meu dono não a teria colocado dentro de uma caixa. Se depender de mim, você vai morrer aí dentro. Mas, conhecendo meu dono, imagino que ele esteja trazendo alguma jaula ou gaiola para você. Tchau, tchau. Guardo minha curiosidade até lá.
A serpente se enervou, e buscava, freneticamente, uma saída, de algum lado da caixa. Logo, então, veio o ratinho, nascido dentro dos porões daquela casa, e perguntou:
- Tudo bem aí dentro?
- Não. Por favor, abra a caixa. – disse a serpente em um tom já mais calmo
- Você não é perigosa? – perguntou, o ratinho
- Não, acredite.
- Acho melhor não. Você pode piorar a situação aqui da casa. Já sou perseguido por dois aqui dentro.
O ratinho teria ido embora, mas a serpente lhe chamou:
- Espere! – e o ratinho voltou para a escutar – Eu sou, sim, perigosa. Se você me tirar daqui, eu cuidarei do gato e do cachorro pra você.
- Você promete?
- Palavra. Abra...
E o ratinho abriu a caixa.


Moral da história:
Prefira os inimigos que você conhece.

Paranóia - Demência

Subitamente, suado, acorda o pai da criança. Pensa ter escutado seu filho gritando por aquele breve instante antes de acordar: maldito pesadelo. Olha ao redor, pelo quarto escuro, para observar que tudo está em seu lugar, inclusive sua esposa, que dorme tranquilamente ao seu lado. Levanta-se e segue para o banheiro, no corredor, entre seu quarto e de seu filho. Acende a luz, e observa seu rosto no espelho de parede sobre a pia. Cansado, com olheiras. Ainda terá que trabalhar amanhã. Droga.

Pára por um momento, olhando ao redor, por algum motivo obscuro. Talvez ainda esteja estranho de seu pesadelo. Fecha e tranca a porta ao seu lado, e se isola do restante da casa. Abre a torneira, e começa a lavar seu rosto e refrescar sua nuca, abaixado. Então, quando fica novamente ereto, vê no espelho um reflexo que apenas lembra o de seu rosto. Como uma imagem de cera, morta, mas se movendo, o observando. Dá um passo para trás, em recuo, mas esbarra na parede do pequeno ambiente. Seu coração dispara, e salta à sua boca.

O ambiente parece escurecer suavemente, e esfria. O homem abraça a si mesmo, por medo, e tentando obter algum conforto, que não consegue. Na imagem do espelho, o cenário detrás de sua cópia parece diferente. Azulejos escurecidos por sujeira, provavelmente de lama. Não, não são manchas de sangue seco. Não podem ser! A realidade do espelho parece alterar-se pouco a pouco, e sua profundidade muda, a cópia agora sustentando um sorriso sinistro começa a se mover, para perto, e... Meu Deus, ela está saindo do espelho!

O homem treme, e começa a sentir suas pernas moles, fazendo com que não sustente mais seu corpo. Ele cai, sentado, tentando se encolher no chão, observando o espelho acima, de onde a cópia maldita ainda sai, e o olha, olha para baixo. O homem está perdido.

Um grito agudo, de agonia, ecoa pela casa, mas ninguém o ouve. Pelas frestas da porta fechada, do lado de fora, pode-se ver que a luz é apagada lá dentro.

sexta-feira, dezembro 01, 2006

Falsos Alísios

Não há o que esperar, se nós já podemos ir agora:
As condições são favoráveis àqueles que as criam.
Não há o que temer, senão o perder tempo valioso.

Temos asas mais fortes que qualquer tempestade,
Condições de impor nossa vontade contra o vento.
Precisamos apenas de disposição, sabedoria, e partir,
Com esperanças, mas sem esperar por coisa alguma.

Corpus Juris Civilis

Para que não houvesse, entre cidadãos, exagero na disputa de interesses que chegasse a afetar a estabilidade do restante da sociedade: um código que regule as ações deles. Para que cada organização, quando tratar com cidadãos, ou com outras organizações não se utilize de malícia para obter ganhos à custa da outra parte. Para todas as formas de negociações e para as mais diversas interações possíveis entre os cidadãos.

Somos tão pouco civilizados que precisamos da intervenção do Estado para regular cada de nossas interações uns com os outros?

Sim, Hobbes tinha muita razão: Nós somos a Leviatã. Cada um de nós, e a nossa soma, uma sinistra ameaça a nós mesmos e tudo ao redor. Triste que nossa salvação seja colocada na compilação de regras que nós mesmos criamos: Sabemos, com clareza, o mais certo a fazer, mas somos fracos o suficiente para precisar que nos obriguem, porque sabemos que não o faríamos por conta própria.

Mythological Rap

All right, let’s go. Orpheus, where´s my harp?
Argonauts, greek mythology (No doubt)
I’ma send you to Hades. Kick it…
-----

Sippin on some nectar, drinkin from that nectar
And i´m up-up-and-away, all along, past Icarus
I’m faster than the Pegasus, or even then Bellerophon,
And I can see from here above that old ass Mount they call Olympus.

I´m not quite sure you follow me: I lived the Heroic Age
Been to Elisium and to the stages, right here on Athens,
I invented, I create. See I’m like my boy Hephaestus,
I tamed the furies, and pinned Prometheus when I gave away the fire,
Take mine. It’s just a do as Hermes would. I ain’t paying it, oh no, I get my rides for free, I´m touched by Midas
( Speaks: ) It’s been too long since I’ve been swimming the Styx, I guess a silver coin does seem cheap now… (You know, I told you)

(chorus)
In my time I did love Helen (Well, who didn´t?), but then I loved so Aphrodite (So it figures)
You think you got my Achilles Heel? You gotta trust me, you’re misguided.
I got alliances; from the Trojans to the Spartans, and I even got some deals with Apollo and Poseidon
I ride with Argonauts (Right on), and I look for the golden fleece (Where the hell is it?), I got Athena as my girl (Not bad), And ambrosia for my meals (Tasty), I´m thessalian


(Etc, etc.)

*Entre parênteses significa participação, fora do ritmo padrão, porém dentro da melodia, de uma terceira parte. Ou seja: é o amigo rapper...Hahahaha. As vírgulas são menos recursos sintático-semânticos, e servem mais para indicar alterações no ritmo (que não está explicitado, mas poderia ser imaginado, talvez...rs)

Fiat Lux

E as bestas foram forçadas de volta ao abismo.

Star-System

O homem precisa de modelos: modelos para seguir, modelos para admirar, talvez, às vezes, apenas para observar. O homem aprende por modelos, desde o pai e a mãe, para as amizades, até os modelos distantes, do cinema e da literatura. A realidade, como é compreendida pelas pessoas, é formada de paradigmas, como se o mundo estivesse preservado em uma pequena esfera de cristal, conservado para sempre, nunca em mutação. Por isso, talvez, as pessoas tenham dificuldade de se adaptar à novas realidades, ou resistam às mudanças que presenciam conforme a idade se aproxima.

Como diria Jung, o homem possui modelos, inconscientes, que ele exterioriza de acordo com suas próprias necessidades ou de acordo com a situação. Modelos que ele busca nas demais pessoas, e que o ajudam a viver em uma sociedade que ele pode compreender, mesmo que de uma maneira um pouco determinista. Modelos que ele irá criar, se preciso for, para satisfazer a essa sua própria necessidade. Seja na arte, seja no convívio com os demais, existirá uma pequena peça em andamento.

A verdade é que o homem aprecia o mundo de fantasia no qual ele vive. As pessoas, como regra geral, teriam tomado a pílula azul. Ele prefere ver o algodão doce às nuvens. O homem é muito idealista, e por isso ele compra idéias e se interessa pelas pessoas, mesmo as apenas personagens, com tanta facilidade. O homem é uma boa audiência.

Dux Bellorum


Queimem as árvores e floresta à frente,
Salguem as terras de seus oponentes,
Encerrem sua linhagem, deixem o pó.

Sangrem a vida para fora de cada,
Dos mestres e de suas bestas, e,
Deixem para trás cidades vazias.

Mantenham a guerra dos monstros,
Para sempre, longe de nossas casas,
E do olhar puro das nossas crianças,
Com a proteção de nosso braço forte.

Ergam as nossas bandeiras, e gritem:
“Lutamos a melhor das lutas, e morremos,
Mas, deixamos a todos o legado de paz”
Enquanto a guerra prosseguiu, bestial,
Sádica, incontrolável, e sem propósito.

Ao final das contas, somos os mesmos:
Lado a lado, ou separados por espadas,
Nascemos, lutamos, e morremos loucos,
Todos, nessa miséria de nossos ideais,
Navegando, cegos, para o grande vazio.

Folclore

Lobisomens, sacis, e conselhos para as moças ainda na idade pura. Mulas-sem-cabeça, crendices, costumes e tradições populares. Mais uma forma de interação, de manifestação cultural, social. A base mais pura do que caracteriza e difere todas as culturas, e, apesar de aparentemente relegada ao plano mais popular, difundida, ao menos como influência, por todas as classes.

O Brasil, essa panela de pressão cultural, apesar de não assumir uma identidade clara neste sentido, é consideravelmente rico em sua produção cultural. Talvez, porque essa manifestação não é uniforme, mas regional, ocasional, errática. As manifestações culturais do Brasil são dialéticas, estando em construção permanente. Absorvemos, criamos, alteramos, recriamos, e geramos nova carga cultural, que passaremos à frente.

E, uma vez que a maior parte dos conhecimentos que nós compartilhamos na sociedade foram obtidos através de aceitação coletiva (consenso, convenções) o que torna as histórias passadas de pessoa a pessoa, de filho a filho, menos reais, ou importantes? É a beleza da simplicidade, e de como dela deriva tudo de mais rebuscado e complexo.

quarta-feira, novembro 29, 2006

Deja Vu

- Faça um desejo. – lhe disse o anjo, ternamente.

O pobre homem, assombrado, apenas o observava atônito. Seus olhos seguiam por aquelas imperiais asas brancas com marfim, para a espada de brilho dourado, não ameaçadora mas protetora, para finalmente descansar nos calmos olhos do próprio anjo, que lhe sorriu e disse:

- Você está seguro aqui. O tempo de suas tribulações está encerrado. Faça um desejo, e ele lhe será concedido.

- Eu posso voltar? – pediu, trêmulo – Viver novamente. Renascer uma criança, eu mesmo, anos atrás?

- Viver novamente, amar novamente, ter maiores aventuras... Existe grande sabedoria neste desejo. – lhe respondeu o anjo, sempre tão paterno – Mas, saiba que sua vida não seria a mesma da qual você sente tanta falta. Todo evento ocorre senão apenas uma vez.

- O que isso significa? – perguntou-lhe o homem, retomando, pouco a pouco, sua calma

- Você terá novos problemas a enfrentar, novas pessoas a conhecer. Talvez, ter que passar novamente por muitas das dores e momentos difíceis, sem saber nunca se você terá a força para resistir a tudo. Batalhar mais uma vez por cada conquista, e nem sempre ter as mesmas chances de uma vez. Talvez nunca encontrar a sua pessoa amada, ou a ver entregue aos braços de outro alguém. Perder amigos, ou correr deles em inimigos. Suar, dia após dia, para conseguir o seu pão, ver como olhares uma vez cúmplices agora o enxergam como um estranho. Lutar para que tudo dê certo, o que talvez nunca ocorra. A sua vida será tão incerta quanto da primeira vez que você a viveu, mas, ainda, será a sua vida, apesar de tudo. Você ainda a deseja? Escolha sabiamente.

O homem teve medo, por estar, agora, diante da maior das escolhas às quais ele esteve sujeito. Tinha medo de ser seu próprio carrasco. Lembrava de seus melhores momentos: de quando seu filho nasceu e de quando ele se formou na faculdade; dos sorrisos de seus pais e das brincadeiras com seu irmão quando eram pequenos, pouco antes dele morrer: talvez tivesse que passar por isto novamente. De quando conheceu a garota de sua vida, e das desilusões que teve. De todos os amigos e de muitos bons dias e noites que passou com todas estas personagens, antes de sua história acabar. Começou a chorar e sentou, onde estava, ao chão, apoiando seu rosto em seus braços cruzados sobre seus joelhos.

- Eu vou me lembrar desta minha vida? – perguntou, secando parte do rosto com a palmas

- Você apenas terá sensações. Breves momentos de uma familiaridade que você não conseguirá decifrar. – lhe disse o anjo, agachando ao seu lado, e lhe segurando uma das mãos, paciente e fraternamente. – De alguma forma você saberá que está próximo de algo do qual você fez parte.

- Eu não posso voltar, não para perder tudo. – chorou

- Você nunca perderá tudo. O seu universo estará sempre aqui, aguardando o seu retorno. Nós nos veremos novamente, e eu o encontrarei mais sábio.

O anjo ajudou o homem a se erguer e lhe disse:

- Não tenha medo. Apenas escolha. Não existe vitória ou derrota: existe percurso. E eu acompanharei você por todo o caminho.

O homem retornou e os seus caminhos se cruzaram muitas vezes com os de pessoas que uma vez ele conheceu. Ele passou por novas experiências, transpôs novos desafios, e quando retornou ao pó, retornou também perante o anjo, que lhe ofereceu:

- Faça um desejo.

Mas, agora, o homem já sabia o que escolher.

terça-feira, novembro 28, 2006

SCRUM!


Ombros em ombros, de cada lado fileiras se preparam para o embate. Ombros em ombros avançam, com força, batendo uns contra os outros criando a formação. Ombros em ombros se travam, e é solta a bola, para que ambos os exércitos disputem por ela. E eles disputam!

As travas das chuteiras arrancam pedaços de terra e grama com a tração dos monstros, que rosnam, e empurram. A bola, solta sob aqueles pés, salta, louca, de lado para outro, rapidamente. Músculos geram potência contra potência, em uma competição por território. Ambos os lados tentam avançar sobre o oposto, em um esforço conjunto de todos os guerreiros. Até que, tão logo a bola é conquistada, o jogo corre, agora aberto.

BREAK!

Intenso! Breve, porém intenso.

Ao final do segundo tempo do jogo, ambos os lados do scrum, e também os backs dos dois times, seguem para o terceiro tempo (Entenda-se: cerveja, risadas, e comentários inapropriados). Um bom dia para o Rugby.



*Compreendamos, então, o perfil dessas figuras: Decididos, ao menos em sua boa parte; bem preparados fisicamente, embora as barriguinhas de cerveja e shandy possam indicar o contrário; inteligentes, que disputam um jogo não somente divertido, mas que garante o bom preparo físico já mencionado e ajuda a canalizar o stress de maneira saudável; bom caráter, demonstrado a todo o momento através de seu espírito desportivo; gentlemen, como bem indica o velho ditado do esporte. (Foi uma análise estranhamente positiva, mas eu sou suspeito mesmo, admito...Hahahaha)

Primus Inter Pares

O verdadeiro conceito do mérito humano, no qual todos possuem um dizer, e todos possuem o igual valor, mas onde a sabedoria e as qualidades tomam lugar e assumem um degrau maior de respeito. Respeito conquistado.

A admiração afoga o ego, e forma um grupo de seguidores, não apenas do indivíduo, mas do ideal que ele representa apenas em ser quem é. Seguidores que não são seguidores, mas partes iguais de um mesmo grupo. As capacidades são niveladas para cima, e todos se aproximam de seu verdadeiro potencial. Todos se tornam arquitetos de grandes conquistas. É essa unidade que cria cidades, que ergue impérios, que traz paz e prosperidade para um grupo, qualquer seja ele.


Mas, para que o primeiro exista, eles todos devem ser iguais. Iguais não em capacidade, mas em caráter, e devem dividir um mesmo ideal. Nossa história não nos mostra muitos desses momentos, o que sempre deixa para trás ceticismos quando estamos frente a frente com essa capacidade. Aprendemos a não confiar em líderes, e também naqueles que nos cercam, por próximos que sejam, e nossa suspeita nos fez desiguais.

Estamos em constante revolução, e todos estão tentando assumir o poder.

Uma questão democrática

Mas, todos querem ter o direito de opinar, é claro, e, para obter a sustentabilidade (necessária a qualquer sistema de organização de pessoas), todos recebem o poder. É claro que, como era de se esperar, quando todos têm o poder, nenhum tem a responsabilidade, que muitas vezes fica para as circunstâncias. (Ou, também comum, para um bode expiatório). Pouco importa, enquanto ninguém precise se preocupar com nada.

A democracia, a exemplo do Capitalismo, possui apenas um problema: o Ser Humano. (Engraçado que é o mesmo problema que criou a necessidade da existência de alguma forma de organização, e que ainda vai tirar o sono de muitos pensadores por terras e por tempos que passem).

Despedida

Mais um momento de reflexão e saudade para todos, mais um amigo sob esta terra onde, um dia, estarão todos os demais. Apenas, muito cedo, muito jovem, como todos os anteriores. A mãe do jovem sofria sozinha, por braços que tentassem a consolar. Todos ali, na verdade, juntos, mas afastados em seus mundos interiores, tentando se afastar dali. O padre dizia:

- Nesta hora triste, existe uma mão que está para nos amparar. Ele disse: Vão, e não tenham medo, pois Eu os guiarei pelas planícies secas até os leitos dos rios, Eu comandarei a chuva por sobre sua plantação, Eu trarei o vento fresco quando estiverem sem fôlego, Eu lhes darei a justiça...

Neste momento, um grupo dos jovens se levantou quase tumultuosamente, seguindo em direção à porta, como já ocorrera antes, anunciando a pegada de armas.

- Não! – berrou, quase descontrolada a mãe do jovem morto

Todos ao redor a seguraram, que se esperneava, com força. Ela gritou para os jovens que saíam:

- Um olho por olho e o mundo inteiro ficará cego!

Eles apenas a olharam, e o líder deles respondeu:

- Você já está cega se você pensa que vingança é a causa. – apontou o dedo ao redor da igreja - Vocês todos! – então, disse, quase com nojo em sua voz – Esperem sua salvação e justiça por aqui. Nós vamos lutar por ela. - partiu para fora

O padre, cansado e já de idade, apoiou seu rosto sobre a mão com a qual conferia as bênçãos, mas não obteve qualquer conforto. Perdia, lentamente sua fé: já havia visto demais daqueles garotos morrerem sem que ele pudesse fazer qualquer coisa por eles. Algumas das pessoas partiram a ajudar o padre, que visivelmente estava abatido demais para continuar.

Não havia mais fiéis naquela igreja. Havia apenas um momento coletivo, onde o único conforto era em ver os olhares ainda com brilhos dos amigos com os quais eles ainda dividiam a terra.

segunda-feira, novembro 27, 2006

Da selva

Nós que moramos na selva, e não na copa das árvores, sabemos apenas como tomar o que nós queremos, matar quem nós odiamos, competir por todas as coisas, e disputar recursos. Não existe a parceria. Existe o direito da força, e sangram os fracos. Quando você descer das copas, não pense que lhe somos hostis por vingança, pois não cremos que a culpa de nossas contas é sua. Saiba que apenas somos hostis.

No rest, no mercy, no matter what

Não-Degradável

O homem é imortal por seus desejos, e mortal por seus temores, já dizia Aristóteles. Ele sabia bem que o homem tinha, em essência, boas intenções, grandes sonhos, queria ser melhor, mas acabava transformado, domado, pelo mundo à sua volta. Torna-se algo pior, menos interessante, menos luminoso. Ao menos em sua maioria.

Alguns ainda retêm seu caráter divino, e buscam terras abertas, com grandes céus azuis. E todos, mesmo aqueles que supostamente perdem seus valores, podem os retomar a qualquer momento. Os valores não são degradáveis, eles são etéreos e eternos, e precisamos apenas querê-los para que comecemos a tê-los.

Não existe Passado que governe o Futuro de qualquer pessoa, existe apenas o determinante Presente, e o alguém que pode ser tudo o que se dispuser a ser. A chave: concentração, foco.

sábado, novembro 25, 2006

Bye Bye

Acabou, acabou...É uma pena
(Que tenha demorado tanto)
Mas, chegamos no momento
De ver novamente o sol
De esquecer o que fez mal
De jogar a bola pra frente.
(Nunca no Rugby, claro)

Agora, vou...E eu não volto
Não pretendo olhar pra trás
Vou seguindo pelo asfalto,
Sorrindo a torto e a direita,
Mandando beijos para o alto,
A cada passo um novo...
(Bem, vocês entenderam.)

Cásper, Cásper, Cásper...Tsc, tsc
Eu tentei, mesmo, melhorar algo ali,
E fiz inimigos com poucas palavras
Sempre palavras de boas intenções,
Que se tornaram hostilidades com o tempo:
Sentença naquele lugar que me tornou pessoa pior.

Faltam palavras...
Queria e queria escrever poema,
Mas, sou tomado pela energia, só aquela energia, aquela mega-hiper-mega-mega-energia:ACABOU, CARALHO!!!
Yahoo! (não confundir com a empresa, mas reconhecer como interjeição de felicidade)
Yes!!! Bye, bye, baby! See ya!!!

"Ei, um momento, ainda há a formatura."
Ai, droga... Tinha esquecido disso...
(Por outro lado, agora percebo que,
Quanto tudo estiver acabado,
Terei saudades.)

quinta-feira, novembro 23, 2006

Agape

- Foi para o melhor... O tempo separaria vocês, mais dolorosamente. - tentou, Diana

Mas, Ângelo não conseguia a escutar. Suas pernas se perderam de sua força e ele apenas chorava, depressiva e desesperadamente, nos ombros de Samir. Seu amigo o segurava, apertado, tentando lhe dar o conforto que apenas os braços e o sorriso de Dalila o trariam.

- Por quê!? – clamou Ângelo, em soluços, para si mesmo

Nos milhares de anos, pelas centenas de vidas, pelos incontáveis momentos juntos, nenhum deles jamais havia visto Ângelo desmoronado em um homem. Apenas um homem: frágil, destruído.

- Por que podemos sofrer tanto, se nem mesmo temos alma para nos dar alguma esperança? – chorou, Ângelo, a seus amigos

Diana desabou em choro, e deixou rapidamente a sala. Cada olhar a observou partir, com mais força o de Samir, que conhecia bem o coração da antiga amiga. Diana chegou à cobertura, para tomar um pouco de ar, ainda com lágrimas que continuavam a escorrer de seu rosto por mais que ela tentasse secá-las.

Diana lembrou de outros tempos nos quais Ângelo costumava sorrir sempre, muitas vezes para ela. Lembrava de outras épocas nas quais eles estavam sempre juntos. Não! Ela havia pensado, como sempre, no bem de Ângelo. Não havia culpa em suas mãos! Ângelo sofria agora, mas daqui em diante ele poderia buscar alguma paz para si mesmo.

Diana temia, no entanto, que ela mesma nunca mais fosse a encontrar.

Mesmo no vale da sombra e da morte

Translação

Estamos em movimento: sempre puxados por uma gravidade irresistível, sempre atraídos em direção à nossa luz, sem nunca a alcançar e também sem desistir. A gravidade, que é universal, age de todos os lados, de todos os corpos, como os desejos de todos, mantendo o mundo em movimento. A nossa própria gravidade, nossa própria relevância, nos mantém ativos, mesmo que nem sempre tenhamos algum padrão – Somos uma inconstante constante de vetores e forças eletromagnéticas.

Metáforas à parte, é fácil perceber, quando olhamos ao redor, o quanto as pessoas buscam ser parte de algo importante, buscam estar cercadas por pessoas que as apreciam e por pessoas que as tornem melhores em si mesmas. Buscamos pessoas ao nosso redor, somos atraídos a elas, assim como as atraímos. É fácil querer um sol que esteja ao centro de nossos anseios, um objetivo que sempre estejamos prestes a alcançar. Ter um propósito é essencial.

Mas, não podemos esquecer que estamos, e estaremos, também, nos centros de gravidade de muitos outros. (Às vezes, nós nos esquecemos disso por estarmos tão concentrados em nosso próprio eixo). Somos relevantes para outras pessoas, e deveríamos tentar ser mais como o Sol do que como a Terra: não buscando ser, mas sendo; nunca margeando, mas ao centro; não errante, mas definidos.

Caso nós consigamos atingir esse novo estado, tudo estará sempre bem em nosso pequeno universo – as energias tendem a se equilibrar quando estamos equilibrados.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Conselho


Sejam montanhas tão altas,
Que, mesmo vistas de longe,
Causam espanto e surpresa,
Em quem observa o cenário.

Montanhas de gelo, ou vulcões:
Estejam, altos, acima dos solos,
Como monumentais castelos de força.

Toquem os céus e as nuvens,
E queiram seguir além disso.

Sejam bem mais que fantásticos.

I thought I told you that we won’t stop

Well, just in case I didn’t: “We won’t stop”.

Paranóia

Tic, tic, diz o relógio constantemente, tic, tic, e a criança o escuta, enrolada firmemente em suas cobertas. Tic, tic, e apenas esse barulho incessante preenche o vazio escuro do quarto, onde sombras de roupas e de objetos parecem criaturas se aproximando lentamente para levá-la dali para longe da segurança de sua casa, para longe do quarto de seus pais – apenas do outro lado do corredor, passando pela porta fechada. Quarto onde a persiana bate com o movimento suave do vento que entra pela janela aberta. A criança tem muito medo para fechá-la: apenas se encolhe mais por sob as cobertas. Tic, tic, diz o relógio.

A porta do armário parece se mover. Não, não parece, ela está, sim, se abrindo. Tic, tic, parece mais alto o relógio. Tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum treme o coração da criança, ofegante, que puxa suas cobertas por sobre a cabeça. Agora não vê mais nada, apenas escuridão, e pode escutar do lado de fora o relógio: tic, tic, tic...E, ele pára, deixando para trás um silêncio sinistro.

A criança pode ouvir apenas sua própria respiração, agora. Há algo exatamente do outro lado de sua coberta. Ela sente, ela sabe. Sabe que nos lugares mais escuros da casa, pesadelos começam a tomar forma. Coisas horríveis. Por detrás daqueles bonecos espalhados pelo quarto, os olhos que tomava como mortos a observam. A criança começa a perceber que, talvez, ela não esteja em um lugar seguro ali.

GRITA! E corre pelo quarto escuro, quase sem olhar por onde vai, ou por onde pisa, em direção à porta que o levará para o quarto de seus pais. Não percebe a porta aberta do armário, ou a mão cinza que a puxa para dentro. Sente, sim, a outra mão sobre sua boca, abafando seu pedido de ajuda. E, vê a luz sumindo conforme a mão a arrasta para dentro, e a porta do armário se fecha, lentamente.

terça-feira, novembro 21, 2006

Super-Homem


O maior dos heróis dos quadrinhos, e não à toa: um herói de grande respeito por si mesmo e por todos ao redor, com um caráter impecável, uma disposição infinita de resolver as situações sem grandes graus de violência, uma força de vontade admirável, e a disponibilidade de alguém que tem como sua prioridade ajudar.


Imagino se o que realmente é admirado nele não é o poder e suas capacidades muito acima das de um mortal. Afinal, as demais qualidades estão todas ao nosso alcance, e não vejo muitas pessoas se esforçando.

Breathless

Amor. E um beijo para sempre em memória
Sempre, em apenas memória, de que um dia,
Embora apenas um dia, eu a tive só para mim

Queria, apenas por um momento, voltar
E dizer muito do que eu não conseguia
Mas, sentia, e sinto, ainda tanto assim

Teria tentado fazer você mais feliz
Seria mais do que fui, faria mais do que fiz
Cometeria menos erros, e aprenderia com eles
Escreveria mais, e daria todas as minhas palavras a você...

Mas, que palavras? Elas vão...
Nem elas me ajudam,
A dizer estas coisas,
A passar estas dores,
Para o papel e para
Tão, mas tão longe,
Que eu as esquecesse.

Mas, se eu as esquecesse,
Perderia também o seu beijo,
E, desculpe, não posso fazê-lo
Ou perderia também minha alma

Você foi minha alma, sabia?

Você é tudo que eu soube,
Tudo que eu conheci, e
Tudo que ainda eu tive
Do amor (e tenho saudades)

Chantagem


O pequeno cãozinho o olhou com aquele seu jeito frágil, seus olhinhos brilhantes. Aqueles pêlos macios de seda, e sua carinha fofa simplesmente davam vontade de agarrá-lo para um cafuné. Ele, então, acabou cedendo e lhe deu um dos biscoitos.

Homo Sapiens Sapiens

O que nós sabemos realmente? Todas as nossas grandes perguntas, as dúvidas que nos assolam desde antes do que nós chamávamos de antiguidade, ainda nos são perguntas até os dias de hoje. O que é o homem? De onde ele veio? Qual o sentido de tudo pelo qual nós passamos? Existem muitas hipóteses e existe muita discussão, mas existe pouca sabedoria.

Tentamos nos admirar com nossa própria capacidade, pois atingimos altíssimos patamares em nossa trajetória. Criamos coisas admiráveis, estabelecemos novos critérios do possível e do impossível, respondemos a muitas das dúvidas. Mas, nunca as maiores, e ficamos para trás, observando o tempo passar, como já passou, e como passará sempre para todos. Vemos o tempo em nossa própria síndrome de Fausto. Vemos, e vemos, procuramos e não conseguimos enxergar as coisas mais importantes: desesperador.

Dance, ao tocar, o arcanjo
A sinfonia de seu carrilhão
Estenda seu véu de mistério
E esconda a verdade de nós

Dura, a realidade, porém, é que as mais importantes verdades não estão ao alcance das nossas mentes, e nem estarão no futuro. Elas formam o tecido fino que separa a inteligência da sabedoria, aquela que aproxima o espírito do corpo, o homem de seu lado imortal. O éter é mais leve que o ar.

"Meus pensamentos não são os seus pensamentos, nem os Meus caminhos são os seus caminhos, diz o Senhor. Porque como os céus são mais altos que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos e os meus pensamentos mais altos que os vossos pensamentos”. (Is 55:8,9)

segunda-feira, novembro 20, 2006

O Efeito Babel

Dizem de uma punição do homem, por sua arrogância, quando muitas línguas foram criadas, misturadas, gerando confusão e separação ao redor. Dizem muitas coisas, às vezes até mesmo em português. Mas, dizem, mesmo que nem sempre nós consigamos compreender. E, por uma época, o que dificultava a comunicação e integração de todos os povos era a diversidade de suas línguas. E, a partir das línguas, culturas. De culturas, interesses, e seguimos nos complicando.

Hoje, não somos mais divididos apenas por nossas línguas. Somos divididos em muitos grupos, e tribos, e “tribos”, e partidos, e ideologias. E, de divisões em divisões, criamos antagonismos, pois tudo que vem de fora, e que gera estranhamento, representa ameaça. E, até mesmo em nossas opiniões em relação ao novo nós diferimos e nos separamos em novos grupos de conservadores e liberais. Hoje, somos únicos, mas também quase isolados, por quantas possibilidades de comunicação sejam criadas.

Hoje, viva o dia da consciência negra, que afasta mais pessoas por suas “diferenças”.

Negros: tão diferentes.
Como todos os demais,
Igualmente, não o vêem,
Não enxergam ou percebem:
Que apenas são iguais.

Não faça o melhor possível, faça o necessário

Uma anedota de papai

Quartel. Os soldados correm ao redor de muitas construções, cantando músicas que ordenam a freqüência de seus passos. De sua sala, o coronel observa atentamente o movimento dos soldados. Ele mesmo já foi um deles. Toma seu café com calma, até que um cabo subitamente bate à porta e lhe pede licença para entregar um recado:
- Coronel. – o saúda à maneira militar
- Descansar. – autoriza o coronel
- Leia isto, senhor. – e lhe entrega uma carta
- Entendo. – entende, o coronel
A carta contava que havia falecido a mãe do soldado 23 (no quartel as pessoas recebem números que as identificam e organizam). Eles, agora, teriam que lhe dar a notícia, mas não sabiam como. Entregar ao soldado a carta seria demasiado frio, e nenhum dos dois saberia como falar com o homem. Chega, então, à sala um sargento, também amigo do coronel, que observa a expressão dos dois e lhes pergunta:
- O que aconteceu, senhor?
- A mãe do soldado 23 faleceu, e não sabemos como dar notícia disso a ele.
- Ah!...Não se preocupe, senhor, eu sou muito bom em entregar esse tipo de notícias. – disse o sargento – Deixem comigo.
- Neste caso, torno a situação sua responsabilidade. Vamos até o pelotão.
Caminharam os três para o lado de fora, seguindo em direção aos homens em momento de exercício. O sargento explicava mais de seu método:
- É tudo uma questão de jeito...
Chegaram até a região pela qual corriam os soldados, e, a pedido do coronel, seu comandante gritou:
- Soldados, formação, sentido!
E todos correram, quase bagunçadamente, para entrar em formação e impressionar o coronel. Quando todos estavam dispostos, o coronel deu autorização ao sargento para prosseguir, e ele o fez:
- Todos os soldados que ainda tem mãe viva dêem um passo à frente. Você não, soldado 23.

PLUFT, desmaiou o 23.

Trilha


Segue a Estrada, segue sozinha,
Segue e liga as pessoas e vidas.
Segue, somente, porque construída,
E graças a investimentos corretos
Em infra-estrutura e transportes.

Sob o céu infinito na vista.
Sob o sol, de calor deleitoso,
Segue e segue a estrada já dita.
Cercada de maravilhas antigas.
Cruzando terras nunca descritas.
Por faltarem palavras para fazê-lo.

Pelo menos, o sol agradável,
O céu, ao horizonte, infinito,
As majestosas artes da terra,
E tudo mais, que à estrada observa,
Não são propriedades estatais.

Carlos e Ana

O amor havia tirado a razão de ambos, e eles fugiram para a Europa. Uma paixão que os possuiu e fez com que pegassem o primeiro vôo para a Espanha. Nem mesmo conheciam alguém daquele país, mas isso não importava: estariam juntos. E, aproveitaram sua passagem, que foi por muitos países. Viram muitas coisas, se divertiram intensamente, e terminaram se cansando na Alemanha – e, sim, fizeram suas famílias viajarem até lá para a cerimônia. Ao final de tudo, então, passaram a morar em Paris, sempre em um romance de dias e noites incontáveis, até o último deles.

VERSÃO 2: Descobriram que trabalhavam no mesmo prédio: aquele enorme edifício de escritórios e consultórios, naquela movimentada avenida. Riram muito quando descobriram, por sinal. Após alguns meses de namoro, casaram: apenas tinha que ser, desde o começo. Mudaram-se para a cidade natal de Carlos, onde Ana conheceu tudo da infância dele através da avó que havia anos Carlos não visitava. A família de Carlos adorou Ana, a família de Ana adorou Carlos, e os dois tiveram uma família só deles, que também os fez muito felizes, como eles se faziam.

A Carlos ocorreram as duas versões, enquanto ele observava a jovem sentada do lado oposto de onde estava naquele trem do metrô. Tão linda que lhe tomou o fôlego, e simplesmente havia algo de certo nela, e no modo como ela lia aquele livro: “Memórias de um Sargento de Milícias”, o seu favorito. Houve, subitamente, no interior do trem, o aviso da chegada à estação. A jovem fechou seu livro e se postou na porta ao lado de onde Carlos sentara, aguardando a abertura da mesma. Ajustou seus óculos.

Carlos esticou seu braço para chamá-la. Ela o olhou de relance. Carlos fingiu uma tosse, e usou sua mão para segurar a barra a seu lado. A porta se abriu, e ela deixou o trem. Carlos a observou se afastando através das demais pessoas que iam e vinham pela estação. Seria seu nome realmente Ana?

sexta-feira, novembro 17, 2006

Gire a roleta


“Clic!” faz o revólver de uma bala.
E ele, vivo, rindo da situação,
Pôe na mesa o revólver novamente,
Tomando um belo gole de seu drink.

Observa os olhos frios à sua frente,
Eles tremem, saltando dele à arma,
Da porta a ele, para a arma, e, ágil,
O homem a empunha, então dispara...
Apenas “Clic!”, e um forte suspiro

Forte, intenso, suspiro desgastante,
Mais para o homem logo à frente.
Homem muito trêmulo, ofegante,
Tomando lentamente mais um gole
E, logo, olhando o cano do revolver,
Que apavora, mas que soa apenas “Clic!”

A arma não atira, mas dispara
O coração do homem d'olhos frios,
Que agora estão tão molhados, tristes
Pois, ele tem em suas mãos o sexto tiro,
Já sabendo que o jogo chega ao fim.
Toma um gole, mas depois engole em seco,
Aponta a arma pra si mesmo e então diz: Foi uma honra.


“Clic!” diz o revólver para ele...

Então, um homem satisfeito diz ao outro:

- Sorte que nós tiramos todas as balas...

Ao que o amigo, também vivo, o responde:

- É...Algum de nós poderia ter morrido.

Marés Vermelhas

O mar e suas águas já estavam acordados quando surgiu o rapaz através da areia. Caminhava, solto, vivo, como se estivesse acordado há horas. A realidade é que havia se levantado há poucos instantes, apenas para chegar ao mar ainda vazio. Apaixonado pelo mar, pelas ondas, queria tudo apenas para si, queria morar ali, mas tinha outras ocupações, trabalho, responsabilidades em geral. Correu em direção à água, pisando na areia fofa: Como adora essa areia de madrugada! Areia que sempre acompanhava o nascer do sol e ainda estava fresca como a brisa que parecia vir de todas as direções.

Salta! Ah, a melhor sensação do dia, ele já sabia, mesmo o dia tendo acabado de começar. Remou para pegar sua primeira onda, aprofundando-se no mar, mas em sua terceira braçada viu cruzar por sob a água o corpo do tubarão. Sentou-se, assustado, em sua prancha, e não pegou aquela onda. Olhou para trás, pensando em voltar, e viu que estava mais longe da praia do que imaginava. Procurou o tubarão, novamente, mas não o viu ao redor. Olhava, preocupado, para todos os lados, e ainda assim não o enxergava.

O sentiu, porém. Em uma puxada forte a sua perna direita, ele virou, sem conseguir resistir em direção à água. Retornou a superfície, com alguma dificuldade, como a que nunca tinha para nadar. Procurava sua prancha, sendo atingido por pequenas ondas em formação, e a viu já distante. Sentiu a água esquentar, e a enxergou vermelha. Então, veio a dor, de sua perna direita, que buscou com as mãos, sem a encontrar.

Desesperado, olhou em direção à praia, mas não enxergou ninguém que o ajudasse. Havia acabado de desaprender a nadar: mexia seus braços freneticamente, assim como girava sua cabeça em busca de alguém, mas mal conseguia manter seu queixo seco. Engolia água salgada, morna de seu sangue, aos goles. Tossia, quase se afogando lentamente, e chorava. O mar usava seu vai e vem para afastá-lo mais e mais da areia, trazendo-o para águas mais profundas.

Sentiu um forte esbarrão em sua perna ainda intacta, e outro em seu tronco. O sol teimava em raiar por detrás daquelas nuvens, ainda cinzas, e ele não o veria novamente. Não sentiria mais aquele calor agradável. Sentiu, porém, dentes afiados, muitos deles, cada um abrindo sua carne, em um movimento rápido, que o puxou para o fundo.

Acordou!

Puxou seu fôlego, e olhou, ainda agitado, ao redor. Apenas seu quarto: escuro, mas seco e vazio. Suas pernas e braços estavam intactos, embora parecessem cansados do esforço do pesadelo. Secou o suor, e disse, apenas para si mesmo:

- Cara, que piração...

Olhou pela janela, e viu uma breve luz vermelha anunciando a aproximação do sol. Olhou, então, para sua prancha. Em seguida, pegou a bicicleta.

quinta-feira, novembro 16, 2006

Oniria

Amanheceu o dia nos campos verdes, onde o sol macio aquece gentilmente o chão e o coração dos habitantes. Também um vento amistoso vem para acariciar os cabelos e o rosto da moça. Ai, que bela...E ela sorri, e acena para seus vizinhos, que lhe sorriem de volta e desejam “Bom dia”, sempre animados. Que casal carismático! Amanheceu mais um belo dia nesse pequeno vilarejo imaginário.






Há que o verde encanto exalar:
Alegria, energia, paz ao redor.
A noite logo logo se aproxima
E, tão só chega, traz a festa
Que atrai toda a cidade, e faz
Da mão cansada a mão do brinde

E todos ao redor o fazem:
Graças a mais um dia feliz.
Olhares se cruzam,
Entre eles os nossos,
Sorrisos e beijos trocamos,
E nos deixamos ao carinho dos demais.
Parto para o lado de fora, sabendo que a verei novamente

Casa bela onde deito ao gramado
E, descansando, paro de trabalhar.
Observo o céu acima, apaixonado,
Por cada estrela, cada estrada de
Cometas, e de todos que moraram
Aqui, antes deste tempo agora meu.

Por um bom momento de calmaria,
Sorrio sozinho, e agradeço a Deus,
Antes de adormecer bem onde estou.
(Acordo em outro lugar, porém)

My lady Eleonor (Ai, ai...In love)

Nesse caso...

- Escute-me nessa.
- Olha que geralmente eu estou certo.
- Eu já vi isso antes.
- Cara, confie em mim.
- Não, não, confie você em mim.
- Não, não, pode botar uma fé no que eu estou falando.
- Não. Acredite em mim.
- Cara, sério, se eu falei...
- Não, não, não, não. Vai por mim.
- Se eu falei, é certeza.
- Não, não. Se eu falei, é certeza.
- Você repetiu.
- Não, eu alterei a entonação. É outra colocação em absoluto.
- Perdeu o crédito...
- Ai, droga...

quarta-feira, novembro 15, 2006

Total Tequilation Annihilation

De quando em quando, na vida, nós caímos, e o mais importante nesses momentos é o esforço para se levantar. (Nota: caso caia de bêbado, não tente se levantar sozinho, mas aceite a ajuda de seus amigos). De tudo, tentemos tirar a lição.

Especifico a condição apresentada na nota entre parênteses, porque estive nessa condição há horas atrás. Descobri, nessa ocasião, que eu gosto muito de muitas pessoas, e talvez não lhes diga isso o suficiente. Percebi, também, que o álcool não tem qualquer lugar na minha vida, como não tinha antes dos anos de faculdade.

É revigorante perceber nossos próprios defeitos, reconhecer nossas falhas, cometer erros. Isso nos dá uma clareza de propósito, uma idéia do que é correto, constrói um ideal a ser atingido. Às vezes, nos falta apenas essa clareza.

Por fim, gostaria de deixar um conselho: se a vida lhe der um limão, não o use para tomar um shot de tequila. (Talvez, use-o para temperar um Habib´s. É uma boa opção.)

terça-feira, novembro 14, 2006

Oculus Leonem


Caminham em sombras de copas de árvores
A Dama Selva nunca protege os seus filhos
Mas, os mata e devora, e deixa que devorem,
Pois, vive também do sangue jogado à terra


Um desses filhos impera por entre folhas:
Senhor de todas as vítimas,
Entidade de morte, temida,
Caçador, causador de agonia,
Escute seu grito ecoar e anunciar seu poder!
“Ruge, o leão!”, “A ruína de todos!”





O leão observa, e acompanha
Fareja, sente maior sua fome,
Almeja: as vidas daqueles ali
Deseja: tomá-las em breve, e
Ele irá, sim, tomá-las em breve
Senhor de todas as vítimas, e novas à coleção


Não há o que a ele resista
Dilacera, esquarteja, extermina
E os esconde na toca ali perto.
Seu pequeno castelo de ossos,
Seu pequeno mural de espólios
Seu pequeno tributo aos mortos


O orvalho da relva ofusca
E faz esquecer do sangue
Que há já não tanto tempo
Encobria o verde de vida
E que vai novamente encobrir, em breve...
(Acorda o leão...)

Magnífica Castle Bravo

Dançam os mortos, ao redor do sol.
Movem-se como bonecas de trapo
Expostas a rajadas de vento e fogo.
Movem-se rápido, e desfazem-se,
Em cinzas, por vales dos escombros,
Daquilo que um dia tiveram, e não mais.



Capitulam-se sonhos, em pedidos de clemência
Não existe nenhum para a conceder,
Só as chamas e o urro da ventania,
Que nada sabem, e nada são,
Vem e vão, deixando para trás o triste vazio.
(Por onde muitos ficam para derramar lágrimas)







Lágrimas de sal, o fatal golpe de misericórdia,
E acabam com o sofrimento do solo ao redor.
Mas, bela vitória, que nos trará séculos de paz.
Os fins, maiores que os meios, nunca alcançados.
Os medos de todos, por seus filhos, e filhos dos filhos,
E o poder sobre o futuro e a vida de todos eles, sob um botão...




Apenas a intenção, de todos os males do mundo.
Por poder em poder, desistimos de nossas forças,
Que um dia foram de criação,
Que uma vez nos tornaram bons,
Que para sempre serão uma capacidade.
Mas, apenas um potencial desperdiçado, em nossas pequenas máquinas de morte.

segunda-feira, novembro 13, 2006

Participe!

Nenhum homem (ou mulher) é uma ilha. Ao menos é o que se diz por aí. Nós temos uma necessidade de interagir, de movimentar as coisas e de sermos movimentados. Uma vontade natural, quase incontrolável, de trocar idéias, para ganhar algumas novas. Estamos sempre em construção. Como este texto...

sexta-feira, novembro 10, 2006

Canção da sirene

Eu a escuto, arrebatado por sua voz.
Ela me encanta e enlaça, me prende,
E já não posso mais fugir do feitiço.

Ela rouba meu fôlego, e me faz pedir o dela
Captura. Ela se faz todas as minhas vontades
E quero fugir para mais perto dela, e provar
Dessa morte, deixar ela ser o meu contágio,
Render minhas forças: não sei se quero lutar.


Não tenho força para me vencer,
Sou muito dela para eu a recusar.
Fui fácil, reconheço sem embuste,
E, agora, preciso ir embora, mas,
Por que peça, por que tente, não há
Não sei se posso, ou mesmo se devo.
Não. Não estou em estado de cárcere.

Fiquei toda uma vida sem a encontrar.
Foi apenas agora, e daqui para frente,
Que senti seu toque, seu cheiro, a vi,
Sua voz, tudo dela, me domina, pede,
Exige toda a minha atenção, e a dou.

Sim, tome-me, pois eu não vou,
Fico para trás, reconheço rendição.
Sua força irresistível me aproxima,
E me desassocia de mim...
Parte em parte...
Pouco a pouco...
Sem combate...
Inexisto.
"De quem falas?"

Vox populi, vox Dei ("Um governo para todos")

Nunca um governo de todos, porque as pessoas simplesmente não são capacitadas para conduzir uma nação com suas decisões, ou mesmo para escolher seus representantes, caso seja esta sua participação. Isto como regra geral. As pessoas buscam seus próprios interesses, ou não possuem a capacidade analítica necessária para entender ações e reações, repercussões, sustentabilidade, ou mesmo qualquer conceito mais complicado do que gosto ou desgosto. O povo em sua maioria existe como o grupo que não possui consciência política, e que, mesmo assim, participa com suas opiniões (que deveriam ser) menos válidas.

A democracia (direta ou representativa) é um sistema falho, e tão injusto quanto qualquer outro, com um agravante: ela irá sempre nivelar por baixo. Ela escolherá sempre um governo tão capaz quanto o povo governado. Nenhum povo será governado melhor do que merece, lembra a velha máxima. E, empiricamente, sabemos que isto é verdade. Vemos corruptos reeleitos, não apenas no Brasil, mas pelo mundo: a democracia não encontra seu problema apenas na conjectura de países subdesenvolvidos, ou abaixo disso. Não, a democracia possui um problema inerente ao seu conceito: um conceito que nivela os direitos de todas as pessoas em uma sociedade.

Mas, as pessoas são diferentes. Elas se diferem em suas capacidades, se diferem em seu caráter, se diferem em muitas coisas, e é apenas injusto que nós façamos questão de garantir possibilidades iguais a todos os cidadãos. Existe aquele conceito por trás da justiça: tratar o igual como igual, e o diferente como diferente à medida de sua diferença.

Não é uma visão autocrática, é uma visão meritocrática, de um cenário onde aqueles com a maior capacidade, usam esta capacidade para melhorar o mundo ao redor para todos. Um cenário onde existiria uma faculdade de política para os futuros governantes do nosso país, e onde as pessoas teriam garantido seu direito de voto apenas se tivessem acesso ao menos ao ensino fundamental, e onde esse ensino fosse realmente para todos: pobres e ricos. Também um cenário onde os políticos tivessem boa fé, e não buscassem dobras no sistema para favorecer a si mesmos, e onde as pessoas em geral tivessem boas noções de cidadania. Em uma ilha muito muito distante, talvez chamada Utopia.

Vox populi, vox Dei? Simplesmente fazer essa comparação, entre o que o povo tem para acrescentar e decidir, com o que Deus tem para acrescentar e quais seriam suas decisões é ofensivo. Estou para ver um pensamento mais demagogo e populista. Dar esse direito aos despreparados, não é dar direito algum: comparativamente, é o que ocorre com a nossa legislação, que só é compreendida e operada por especialistas. Afinal, seria moralmente errado permitir que alguém interferisse nas decisões da justiça e nos destinos de infratores, criminosos, causas judiciais, mas é apenas natural que todos tenham direito a um pitaco no futuro de uma nação, cujo destino é em absoluto mais simples e sem repercussões.
É só a falta de consciência política que faz a maioria das pessoas não perceber que às vezes um beijo nos entrega nas mãos dos romanos.

Uma questão de respeito

Sou sempre criticado por fazer questão de argumentar em discordâncias, e por esperar o mesmo em contrapartida. Já fui chamado de arrogante, prepotente, etc, etc. Mas, argumentar não é exatamente uma forma de demonstrar que você respeita a opinião da outra parte como igual, e explicitar que você mesmo se sente na necessidade de apresentar corretamente suas colocações, porque reconhece na outra pessoa o mesmo valor que em você mesmo? Alguém argumenta porque sabe que a sua opinião não será mais válida que a alheia, senão quando estiver embasada em argumentos que justifiquem a contrariedade de posições.

O que as pessoas entendem por democracia, quando iniciam discussões comigo, é: “A minha idéia é a correta, e eu bato o pé por ela”. Mas, por quê? “Porque a minha idéia é a correta, e eu bato o pé por ela”. Isso não é nada democrático, bem verdade que é quase o oposto: autocrático. A democrática exige discussão, argumentação, apresentação de pontos e contrapontos. Sem isto, nós soltamos Barrabás e crucificamos Jesus.

p.s. - Bem, Papai queria, e eu sabia que deveria ter prestado Direito. Ai, ai, uma hora o saco não agüenta...

quinta-feira, novembro 09, 2006

Buenas noches

- Sleeping time!
- Allright!
- Right!
- Who wants to sleep?
- Vamos dormir, sério.
- Paulie wants to sleep.
- Boa noite, sério.
- Ok, ok. Buenas noches, Pedro.
- Buenas noches, Sanchez.
- Buenas noches, Alfredo.
- Buenas noches, Esteban.
- Buenas noches, Almodóvar.
- Buenas noches, Ernesto.
- Buenas noches, Ramón.
- Buenas noches, Ricardo.
- Buenas noches, Javier.
- Buenas noches, Jorge.
- Buenas noches, Bernardo.
- Sério agora, eu quero dormir.
- Ok, boa noite.
- Boa noite.

(...)

- E, mande um boa-noite para a Conchita.

Mustang Boss

quarta-feira, novembro 08, 2006

Agonia

Sozinho. Apenas casas vazias ao seu redor (o mundo simplesmente estava assim quando ele acordou). Uma sensação de culpa o percorre: queria tomar de volta as palavras que proferiu a muitas pessoas que, imaginava, nunca mais veria. Caminha, pela madrugada, na cidade morta. Nenhum ruído senão o de seus passos. O silêncio o assusta, mas ele prefere não pensar a respeito.

Um frio na espinha o acompanha, e ele constantemente observa o caminho que deixa para trás. Há sempre a sensação de que algo está à espreita, o observando. Tantas janelas vazias, escuras, por detrás de onde tantas coisas podem estar o acompanhando. Famintas, talvez. Horrores. Ele está com medo, e anda apressadamente, embora não perceba. Prefere não pensar a respeito.

Pode apenas pensar a respeito. Respira aceleradamente, anda aceleradamente, procura alguma rua conhecida, mas, mais do que isso, procura algum rosto conhecido. Procura qualquer pessoa. Procura alguma saída daquele sonho (tinha medo de usar a palavra pesadelo: é tudo tão real, tão real demais...). Tinha medo de não ter para onde acordar, e de aquele ser o último mundo que conheceria.

Pára em frente a uma loja, cujas luzes estão apagadas, como a maioria das demais pela cidade. Apenas a luz dos televisores, que parece tão sinistra agora, ilumina uma pequena parte do cenário. O restante do vazio escuro o aterroriza, e ele teme se aproximar da vitrine. Ainda, pode ver com clareza as imagens em movimento: pessoas, e elas conversam, ele percebe, embora o som das televisões não passe pela vidraça. Conversam sobre ele? Conspiram!

“Meu Deus, estou ficando louco...”. Sentia que aquele não era a primeira noite que passava ali e que sua memória o enganava. Sentia que estava perdido naquele lugar já há muito tempo. Algum lugar afastado, de onde ninguém poderia o salvar. Um lugar onde ninguém o ajudaria. Enjoou-se, e vomitou na sarjeta.

Subitamente, uma batida na vitrine da loja, vinda do lado de dentro. Seu sangue gelou, imediatamente, e ele se moveu muito muito lentamente, trêmulo, para ficar ereto. O barulho veio do lado de dentro da loja. Ele voltou seu rosto para a vitrine, mas viu apenas, imersos na sinistra escuridão daquele interior, os televisores, dos quais agora as pessoas o observavam, fixamente. Apavorado, ele não consegue se mover sob aqueles olhares ruins.

Suas pernas fraquejaram e caiu para trás. Mas, manteve seu olhar na vitrine, na qual via apenas os televisores, e as pessoas que o observavam, com olhos arregalados. Tremia, sozinho naquele lugar escuro. Começou a chorar, homem crescido. Lembrou do porquê estava ali...

Besteirices

- Digamos que você encontre um milionário excêntrico...
- Ah, a velha questão do milionário excêntrico.
- Você deixaria cortarem a sua mão esquerda por 1 bilhão de reais?
- De dólares, sim.
- E quanto às duas? Dois bilhões.
- Não.
- Dá pra comprar umas mãos ciborgues com esse dinheiro.
- Mas, com elas eu não vou sentir meus super-carros, nem minhas lanchas, ou mesmo minhas mulheres lindas.
- Sei, sei. E quanto a uma tatuagem? Você faria uma por mil reais?
- Não.
- E por dez mil?
- Não, acho que não.
- Por um milhão?
- Não.
- Por cem milhões?
- Eu vou falar “Não” só pra ver até onde você vai aumentar a sua oferta. Aliás, esse seu dinheiro não acaba não?
- Eu pego vários empréstimos. Além disso, acho improvável que o meu banco imaginário passe por uma crise econômica e vá à falência.
- Ok, vou ter que concordar nessa.

terça-feira, novembro 07, 2006

Message d'Amour des Dauphins


Sex or dolphins?

- I will trust you all.

- Go then! If you are one who would not fight for his own home, you are not welcome at our side. – said Charles
- Leave! Quickly go, out of our sight! – screamed Henry
- I’m sorry things turned out this way… - Adrien tried to apologize, in tears
- Not more than we are. – said Daniel, in a half-whisper
- I’m so sorry… - Adrien cried as he turned away and left, almost in a hurry
His three old friends just gazed at a broken dream. Each one of them would die alone that night. But, before the sadness of that disappointment could overtake them, there was a loud voice of command from Daniel’s mouth:
- Barricade the inner doors! Set the oil pits, and raise all our banners from the all sides of the castle. Let them know we are ready for a war!
All soldiers who heard the command shouted a compliant salute, which took over the entire construction, as big as it was. Still, Daniel could hear Henry tell him, truly:
- Thank you.
- No time for gratitude. There’s much more we need do here before we are worthy of it.
- Pray fortune, stay at our side! – Charles said, then set his hand between them for their last war cry
Before the sun had set on the horizon behind them, the coming night announced the arrival of the army of all furies and despair. Then, rose Lady Death, to be witness to her children’s bravery before she helped them with the transition.

domingo, novembro 05, 2006

sábado, novembro 04, 2006

Need for speed

O monstro sob o capô ruge, controlado apenas pelos pedais sob seus pés. Os olhos, nervosos, observam o farol acima, aguardando, fixados naquela luz vermelha, como se pudessem torná-la verde com sua vontade. A respiração segue lenta, preparando-se para parar por alguns instantes: parar, porque é menos importante do que a experiência por vir. Dobrar, desdobrar e ultrapassar os limites naturais do homem. Estar além de qualquer mortal, ou fera, e correr pela terra, tão rapidamente, e dominar tão em absoluto a velocidade e cortar o ar, e se fazer como Hermes, e ver como o tempo passa mais lentamente naqueles alguns instantes de imortalidade.

E, o verde, vida do corredor, surge como uma estrela guia à frente.
Ruge o motor, enfurecido. Embreagem/Câmbio/Embreagem/Freio de Mão (...)

Os pneus se desprendem do asfalto por alguns instantes, cantando uma música só deles, até que, repentinamente, eles voltam a aderir ao chão abaixo. A máquina inclina suavemente o seu nariz para cima, finalmente livre, inclinando consigo seu mestre e condutor. O estômago subitamente esfria com a brutal arrancada: todas as coisas se aproximam rapidamente, pequenos movimentos no volante buscam a estabilidade (sempre por um fio). A adrenalina que o percorre, une-se a ele, é como droga transcedental: o corredor vê um novo universo, vê as coisas diferentes que sempre estiveram à sua volta. Os pistões batem freneticamente, como o coração dele. Sobrenatural. Um instante eterno, mas tão fugaz. A chegada, chegamos a ela. Os discos reduzem a rotação das rodas, diminuem a velocidade, encerram a passagem. Fôlego, fôlego. Foi tudo muito rápido...

...Talvez, com algumas mudanças no mapeamento da injeção, alteração para pistões e bielas forjados, e instalando algum sistema de sobrealimentação do motor, consigamos ser muito mais rápidos. Preciso de uma dose maior.

sexta-feira, novembro 03, 2006

Cuide deles.


Guarde e ilumine o caminho de volta.

quinta-feira, novembro 02, 2006

Carta a um velho amigo russo

São Paulo, 02 de Novembro de 2006

Meu velho amigo, lhe escrevo esta carta para dizer coisas que não conseguiria lhe contar ao vivo, e, ainda, coisas que eu gostaria que você soubesse.

Primeiro, que fico muito feliz que você tenha vindo da Rússia para ficar. Tenho consciência de que a situação na qual você deixou seu país não foi a que você gostaria, mas você soube aproveitar o limão que a vida lhe ofereceu (e adicionar um pouco de açucar) para fazer algo melhor, e fez. Sou contente com a sua presença no Brasil.

Segundo, que você me ajudou muito, meu querido amigo. Saiba que, sem você, estes amargos anos de faculdade teriam sido difíceis de suportar. Você deu um novo sabor à vida, com sua simplicidade, com sua suavidade. Sempre presente, sempre disposto a fazer sua parte. Lembro de alguns bons momentos com você e outros amigos, antes de alguma balada, ou também durante ela.

Mas, não somente eu. Sei que você esteve presente para muitas pessoas, mostrando o seu caráter altruísta e até mesmo universal. Você foi querido na Rússia, e agora é querido por muitos e por todos os lugares. Realmente, teria sido egoísmo seu ficar em sua terra natal. Você fez muitos darem risadas e se divertirem, ajudou muitos outros a desabafarem, até mesmo conseguiu que eles esquecessem muitas coisas desconfortáveis de se lembrar. Você faz do mundo um lugar melhor.

Espero sempre continuar a encontrá-lo por festas das quais eu participe, mesmo aquelas após os meus anos de faculdade. E, espero continuar a encontrá-lo também pelos mais diversos lugares, como sempre nos encontramos: em um supermercado, na padaria, ou mesmo em alguma loja de conveniência. Muito conveniente, muito por acaso, talvez fosse apenas o destino.

Abraços, meu querido Smirnov

p.s. - Fiquei sabendo que você fará uma ponta em mais um filme do James Bond. Parabéns! Você merece.

segunda-feira, outubro 30, 2006

Atlas

Eu sou Atlas, que carrega o mundo nas costas, como fazem todos os sonhadores.

E o mundo é tão pesado, tão pesado, e eu já estou tão cansado, mas não vou o soltar.

Queria ter quem o carregasse comigo, mas queria mais que ele fosse leve (Tão leve)

Flutuasse, e me levasse para qualquer e todos os lugares, sempre bons e calmos

Onde existisse brisa gentil para acariciar meu rosto e um rio para matar minha sede

Quando eu conheceria a menina das flores e ganharia dela um beijo e lhe daria outro

Seria sempre feliz, e faria do mundo mais leve (Tão leve) e seria mais leve com ele

Mas, sinto meus pés afundarem na areia, e o peso nos ombros crescer (Sofrimento)

E sinto, por mim e por todos, que não haja futuro melhor do que este que temos

sexta-feira, outubro 27, 2006

Cordeiro Félix Ltda.

Cordeiro Félix Ltda.

Missão: Criar filhos com caráter e valores não maleáveis, que contribuam para a sociedade e para o mundo em geral, através de uma vida digna e positiva. Esperar que eles tenham bons amigos com quem possam contar, e que sejam eles mesmos bons amigos. Esperar que eles sejam sábios o suficiente para encontrar o caminho por meio das mais ferozes adversidades, e esperar que eles sejam fortes o suficiente para não desistir nunca.

Objetivos: Ensinar a eles sobre os valores essenciais para a jornada à frente. Esperar que eles consigam passar esses valores para seus próprios filhos e que nossos ensinamentos sejam os guias e o conforto para cada um deles em momentos de dúvida.

Valores: Caráter, amizade, união, família, honestidade, caridade, respeito, amor, coragem, fé, justiça.

Balanço 2006: Um futuro diplomata, uma futura psicóloga, um futuro escritor, e uma juíza. Não perfeitos, mas boas pessoas. Bons amigos, e companheiros, que se adoram demais, embora discutam de quando em quando. Não acho que a empresa poderia ter se saído melhor, mas ainda estamos em 2006 e há muito pela frente.


Beijos para meu pai e minha mãe (que já não está mais aqui)

terça-feira, outubro 24, 2006

Jogo de Equipe (Um abraço para o Hand e para o Rugby da Cásper)

A vida é um jogo: o maior dos jogos, o jogo do risco máximo. Analisamos, escolhemos, damos sorte ou azar, e ao final decidimos tudo que nós fomos e o que deixaremos para trás. Um jogo solitário, no qual a responsabilidade será só nossa, mesmo que nós tenhamos ajuda no meio do caminho. Um jogo sem regras, exceto por aquelas que escolhemos aceitar. Um jogo muito diferente dos esportes que nós praticamos: geralmente esportes de equipe.

E, que conceito fantástico esse é: “equipe”. A mesma idéia que deu origem às sociedades: a idéia de que o conjunto é maior, mais forte, mais representativo, do que a soma de suas partes. A idéia de que cada pessoa tem algo de original a acrescentar, algo que será importante para os esforços de todos os demais.

Uma idéia que gera união, que cria uma unidade de pensamentos, define um objetivo em comum. Um micro-universo onde as regras são iguais para todos, onde o todo valoriza o indivíduo e fará o possível por ele, e sabe que ele fará o possível em resposta. Neste mundo paralelo, onde a velha máxima de “um por todos e todos pos um” ainda se aplica, podemos desempenhar o nosso máximo, e iremos, porque teremos dele o que não sabemos se algum dia nós teremos ao final da vida: um resultado.

Somos na quadra quem somos na vida: aqueles que jogam mesmo quando machucados, aqueles que jogam pela equipe ou para si mesmos, aqueles que respeitam os adversários, e aqueles que estão absolutamente contra eles. Todos inseridos em um universo de mérito, onde as chances são iguais, e os melhores e mais ávidos possuem a vantagem. Uma realidade quase irreal, tão melhor do que muito da vida que vemos ao redor. Jogamos também por isso, para saborear um pouco de como as coisas poderiam ser.

Mas, mais do que isso, nós jogamos por nossas equipes, porque somos valorizados, fazemos diferença, seja por nossas habilidades, por nosso apoio, ou mesmo por nossa simples presença. O esporte é um conceito: de uma competição saudável, onde existe respeito entre inimigos, e união entre diversidades. Um conceito de Olimpíadas, de Copas do Mundo, e de todas as competições. Um conceito de ser humano. Um ideal compartilhado. Jogamos porque, no fundo, temos mais em comum do que temos de diferenças.

sexta-feira, outubro 20, 2006

Jardim de Flores Partidas

Jardim de Flores Partidas


O verde tornou-se o cinza,
Não resiste mais à ausência do sol.
Morreram esperando a manhã:
Foram flores e tiveram muitas cores belas.

Agora apenas o vento as encontra, em pó,
E estira lamento por campos e vales.
Ar pesado que as leva faz com que todos,
Se levem, também, pelo desespero da paisagem.

Chora, sozinha, a menina triste.
Chora, triste, o menino sozinho.
Choram juntos, mas separados.
Choram e oram por algo melhor.

Nesta terra seca, que cansa os pés que a percorrem.
Percurso longo demais para se fazer sozinho!
“Solidão é a canção do viajante destas partes,
Não se esqueça: não espere salvação ou qualquer sorte”.

(...)

Passos lentos, arrastados
Choro fraco e sofrido
Passos lentos, arrastados

(...)

O pássaro observa o movimento dos aflitos.
Apenas observa, em silêncio e reverência.
É daqueles que gostariam de fugir dali
Mas, não tem mais como voar.
Está cansado, tão cansado.

A primavera desfez-se em inverno.
O sorriso desfez-se no pranto.
Talvez, apenas um sonho...
Triste, mas finito.
(Acta est fabula, plaudite!)

Gafanhoto

Dor. Como um alicate pressionando as pequenas juntas. Sempre uma sensação como se ossos estivessem prestes a se partir em partes menores. Apenas o incômodo, o inconveniente. Nada a se preocupar...Ai, ai...

Ou: digitando com apenas uma mão. Vou colocando alguns textos antigos...rs

quarta-feira, outubro 18, 2006

Social-Demagogia

Imagino que todos os meus poucos (mas fantásticos – Aê!...rs) leitores tenham consciência de que o Brasil é uma democracia representativa. Isso significa que o poder do Estado é colocado nas mãos de nossos representantes, estes eleitos de forma democrática através do nosso próprio processo eleitoral. Explicação superficial, mas compreensível, certo? Pois bem...

Estamos tendo um grupo (ok, mais uma miríade) de problemas com o governo atual, e bem verdade que a próxima opção não é tão mais satisfatória. Não, não a corrupção (Aliás, nem entremos nesse mérito). Estou falando mais especificamente do estilo de governo que foi definido como Social-Democracia.

A Segunda Internacional (Socialista) composta pelos grandes representantes de partidos sociais democratas, socialistas e trabalhistas, definiu a Social-Democracia como a forma de governo ideal para uma democracia representativa. Isso porque seria a forma ideal para reduzir as brutais diferenças sociais e econômicas geradas principalmente nas economias liberais (com este termo, sozinho, já sabemos exatamente quando esta idéia se consolidou, não?).

E, foi realmente uma idéia válida para ir de encontro às situações de crise, ou de momentos pós-guerra, mas a grande verdade é que ela cria uma condição desfavorável para um país em condições normais de desenvolvimento. Talvez uma metáfora esclareça o porquê: esta postura do Estado é uma muleta – para os necessitados ela dará a sustentação necessária para seguir caminhando até sua recuperação, mas para uma pessoa saudável, ela impedirá um caminhar comum e tornará uma ou as duas pernas mais fracas do que deveriam ser.

Um governo de promessas de novas condições, sustentadas por demagógicos projetos assistencialistas que não servem senão como paliativos. Projetos que ensinam os ajudados a depender do Estado e removem bons investimentos de áreas importantes para o real desenvolvimento social. Projetos que geram um Estado hiper-desenvolvido no comando de uma máquina econômica sempre de alto-risco e menor retorno devido ao pouco investimento. E, uma postura que constrói um povo apolitizado e muito sujeito a populismos e palavras vazias.

Saldo: muito bom para manter o status quo, e algo péssimo para realmente dar oportunidades tanto para o país como para as faixas mais necessitadas da sociedade se desenvolverem e se tornarem parte integrante da nossa “economia globalizada de capitalismo financeiro Pós-Séc. XX”. (Uuuufa...Pelo menos eu escrevi, não li, esta...rs)

segunda-feira, outubro 16, 2006

Mujahid

Jihad. O esforço maior, a guerra interna, espiritual. A batalha através das muitas forças que se direcionam contra o caminho de justiça e do bem. Essa guerra está em andamento. Esta guerra dos mil séculos, que foi dos nossos pais, e dos deles, e que deixaremos para nossos filhos, e eles para nossos netos, e na qual devemos senão fazer a nossa pequena parte, e nunca presenciar a vitória do duelo.

Dos muçulmanos, conhecemos mais da Jihad pela espada, e do derramamento de sangue. Não me refiro a uma guerra com derramamento de sangue, e espero que ela nunca chegue a esse ponto, porque vejo a derrota moral na apelação para as armas. Não. Nós estamos inseridos em uma guerra moral, travada por toda a sociedade, e pela soma das sociedades. Uma guerra de valores, uma guerra ética: mais uma guerra da formação de indivíduos do que de sua utilização estratégica. Uma guerra não para os soldados, mas para os professores, e para os pais. Um momento para a cidadania, e para o altruísmo. Um momento do qual nos afastamos mais e mais.

Desta guerra cruel, onde não existem adversários claros, saímos frustrados, desgastados, desiludidos. Não encontramos tantas outras pessoas que se importam com as demais, e que tem valores pouco maleáveis. Nem pessoas que entendam que a menor de suas ações irá falar sobre quem elas são, no que acreditam, ou quais são seus valores. (Hoje em dia os valores mais importantes para a sociedade são colocados em medidas ou em dólares)

Nós vimos, nestes últimos anos, a quantidade mais brutal de casos de corrupção já acompanhada no nosso país. E, a grande verdade é que essa falta de caráter que nós temos presenciado não é política, mas social. Nossos governantes apenas seguem à proporção do restante da sociedade. Então, tenha em mente: cada vez que você ver alguém sabotar outra pessoa, tirar alguma vantagem indevida, trapacear ou realizar qualquer atividade moralmente errada, pense em quais valores você sustenta, e lembre-se da importância que você tem em meio a essas marés de corrupção, individualismo, e falta de caráter.

A responsabilidade é de todos.

domingo, outubro 15, 2006

Os doze poemas

Um para o primeiro:

Sabia que não sabia, e tentei.
Acreditava poder descobrir e falhei.
Deixei para trás minha casa.
Deixei para trás coração.
Deixei a mim mesmo na cela.
(Com barras de minhas escolhas).

Rezei, mas não fui atendido.
Largado, batido, vendido.
Sozinho, sempre tão sozinho.
E, então, não sozinho, tão forte.
Mas, longe de onde gostaria.
(Gostaria por mim e por todos).

A estrada seguiu, infinita.
Nos levou para as terras malditas.
Malditos, nós, mesmo que benditos.
Pois, entre ditos e ditos, não merecemos menção.
Senão a menção pesarosa,
Daqueles que tentaram em vão.

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Dois para ela:

Um beijo doce da donzela dos ventos.
Um beijo da princesa de tantos encantos.
Guardado para aquele amigo:
Companheiro, mestre e discípulo,
E o que mais ele pedisse e quisesse.

Um beijo perdido em prantos
Choro alheio aos olhos de tantos,
Por próximos que fossem, distantes
Do que passa na alma da moça.
(Mulher, ainda moça, tão jovem)

Os dias, que passam tão lentos,
Carregam consigo a tristeza
(Um beijo, apenas um beijo)
Dos lábios a ele entregues.
Entregues, mas nunca aceitos.

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DE UM REI:

Para o povo um servo fiel.
Meu pai orgulhoso estaria
Por me ver governar sua Eudia
Da maneira que ele o quisera

Do novo algo a aprender.
Paciência, virtude de um rei
Com o tempo, mistério desfez
Descobri que, às vezes, esse rei
Deve pensar além de si mesmo

E se o todo novo não fosse eu
Saberia escolher facilmente
Pois, esta escolha não é tão somente
Entre o povo e o meu interesse
Mas, de algum interesse maior
Tão maior que meu povo e eu mesmo

E, então, neste jogo sagrado entrei
Companheiros vieram de outras terras
Com histórias que as minhas mais ermas
E, ainda, com corações que em todas as eras
Tão raramente se pode ver aflorar.
E eu, rei, me vi, não mais que de repente,
Admirado servo a os acompanhar.

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LIBERTADOR:

Por que eu? Acaso não nasci inocente?
Ainda nem me entendia por gente
E eu já me erguia com o nascer do sol

Do suor não vivia, mas sobrevivia,
Cansava, penava, doía, sofria,
E vi tantos amigos voltarem ao pó

Tristezas demais que a noite escondia
Um homem quebrado. Esperança morria
Até que um dia, do escuro, farol.

Luz da liberdade, logo à minha frente
Agora, de escravo, me erguia regente
E não descansava: do povo em prol

Uma nova esperança, futuro surgia,
E o vento trazia aquele novo lar.
Tão longe de casa, onde o coração,
Finalmente encontrou algum tipo de paz.
(Graças a Deus, sempre)

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Pulso:

O vento o viu passar, veloz,
E ouviu de longe o coração do jovem,
Pulsar, como águas turbulentas, agitado
Como maremotos infinitos (“Que espírito!”)

As árvores o viram passar entre elas
Mais alto e imponente que toda a floresta
Seguia indomável, invencível, temido
Temido por tão destemido (“Façam caminho!”)

A montanha o tentou impedir de subir
Erguendo-se alta, alta, até nuvens distantes,
Mas, o jovem não desistia ou cansava (ou pensava)
Só subia, e subia, e venceu a gigante (“Eu me curvo!”)

O rio, orgulhoso, dizia a si mesmo
Que suas margens seriam o fim da jornada
Do jovem resistente a desânimo e medo
Que sempre impediam muitos de seguir.

Mas, não foram o final da jornada as margens
Margens distantes, mas margens (possíveis)
Nas quais o jovem provou sua estirpe
Quando a nado seguiu de uma à irmã
(“Eu me faço humilde...”)

Mas, nenhum disse tanto quanto ele mesmo,
Quando disse a seu reflexo nas águas do rio:
“Mais um dia sem arrependimentos, mas, ainda
só um dia, e tenho muitos pela frente”
(e ele seguiu, e muito ainda foi dito)


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Distante

Costumava ser sozinho (e triste)
Perseguido por ser eu (horrível)
Abandonado em nascimento, (lembro)
E se à sorte que é minha: extinto

Cresci sob o medo do chicote,
Que estalava tendo ou não motivo crível,
Na minha pele ainda fina de criança.
Que na infância nada teve de carinho

Agora, à noite, no meu leito, ainda sinto
E, antes do chicote fosse a dor...
Mas, das feridas que o tempo
Por poderoso que se mostre sobre tudo
Não envelhece e não mata, nunca mata
Mas, ainda, ele me mata
Pois ele passa e passa
E nada nunca passa
Mas, dói...

(...)

E, um dia, que só veio com o tempo
Veio o vento, e me trouxe boas novas
Por velas claras, anunciadas à distância
Minha família, a que muito me faltava

Tudo mudou, e eu mudei, e eu sou grato
Ainda que fraco, acompanhando meus irmãos
Tentando sempre fazer jus a seu abraço
A cada dia de esforços, nunca em vão

Costumava ser sozinho (e triste)
Perseguido por ser eu (horrível)
Agora em casa se estou junto a eles
E, por eles, digo agora: eu vivo

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Guardiã :

Bela donzela de olhos esmeralda
Visão como sol em dias frios
E, ainda, a ela sempre a injustiça
De não falar do que dela de mais belo
Não ficou pra sempre e sempre escrito
(E tenho saudades de quem ela era)

Seu olho de águia vê mais do que todos
Seu olho de águia vê longe e mais longe
Mais longe, e ainda mais longe (tão distante...)
E, acredita que pode alcançar, porque pode se ver também ali,
Como gostaria de ser, e como gostaria que tudo fosse
(Eu gostaria de ter visto o mesmo)

Mas, o tempo passa e os sonhos mudam.
Nunca os dela: força da natureza
Ela, sempre ela, seguiu e segue
Viajando, sempre peregrina.
Porque ela apenas é, e será sempre,
Como a mais suave brisa: livre.

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A única chance da paz...

Esta guerra nunca foi minha
Mas, sempre a entendi de todo coração
Percebia que a paz se não nos for dada
Será conquistada. E que vença o melhor.

A melhor serei eu, a melhor serei eu
Amazona da paz, corajosa, feroz
E, pra sempre, pra sempre, abraçada (carente)
O orgulho da mãe, nunca mais combatente

Que tudo se converta no que esperamos
Espadas em arados, e guerras em vida tranqüila
Fortalezas em cidades, soldados em pais de família
E, ao final, foi para isso que lutamos

Então, salvem aqueles que lutam e resistem
Salvem as armas e as mãos que as empunham
Porque a única chance da paz,
É que lutem por ela...(Embora...)

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Pira :

Dias, e dias e dias e dias
Andando sob o sol de desastre
Cansado, mas, ainda, energizado.
Enervado, por fúrias impulsionado,
Do garoto um mero sussurro já fraco.

Noites, e noites e noites e noites
Imerso em sonhos de mortos e chamas,
Calor, mal-estar, e insônia, e choro (Fraco...)
Homem pequeno (Guerreiro, guer-rei-ro!!!)
E sinto energias fluírem, de veias ao corpo
De rios de lava por sob esta terra os gritos

Gritos, e gritos e gritos e gritos
E o meu, perdido entre tantos, eu ouço
Pedidos, suplícios. Ignoro os aflitos, e tomo,
Em mãos a lança partida, perdida, mas viva
Ativa. Sedenta, encerra em si o início (a sina)
Artefato de sangue, destino (Vin-gan-ça!!!)
Esperança de um dia salvar estar terra (Tolo!)

Do fundo, no fundo, pro fundo, afundo
E, perdido em mim mesmo, desisto em todo
De achar minha paz, sob a terra ela jaz
O meu sonho desfaz, e só resta o ódio (...)
O sol, a morte, a sede e a fome
Amigos a menos, e, sim, pesadelos,
Que não vão embora com o nascer do sol
E no dia seguinte eu acordo, e nada mudou...

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Causa/Consequência:

Viva as bandeiras de Palas-Lamar
Salve a ideologia de honra e orgulho
E o sonho: a promessa de um belo futuro
Amor, carinho e todos os lares seguros
De mar a mar, por todo o império seria assim
Bela Lamar, casa de meu pai (e seus sonhos)

Ah, Lamar dos sonhos de meu pai
Antes fosse dos meus e eu visse em ti
O mesmo calor e beleza que outros vêem
Mas, o frio nubla esta minha vista, e
Como há quem desista do sonho, assim eu
Também o faço, e me desfaço dessas ilusões

De meu reino vejo apenas a tragédia,
Rodeado por política e falsos amigos,
Sozinho entre muitos, ocupado por ordens
E por lembranças dos amigos que perdi
Para esta guerra, que não comecei, mas que esperam que
A torne paz, com a vitória... (Eu deveria estar sozinho assim?)

Eu deveria estar sozinho assim?
Deveria ser como espera o meu pai?Deveria...(Como deveriam ser as coisas?)
Apenas quero ter direito a uma escolha (uma)
Queria ela (embora ainda apenas um conceito)
Queria a bela que ocupasse os pensamentos meus

A ela para sempre o meu carinho, mas, por hora,
Que eu seja, então, o fio dessa espada. Seja eu um instrumento de batalha
Sejam as ordens o meu credo e a segurança do império obrigação
E, seja essa fronteira a minha fronteira, e aos invasores deixo o aviso:
“Cuidado, cuidado, pois eu não terei clemência.”
(Ai de mim...Há que haver boa-fé nos povos)

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Lamento:

Dancem as espadas e bebam o sangue de meus inimigos
Dancem os escudos e que eles sejam guardas de minha causa
Eu me ergo em desafio, não me dobro nem ao frio, nada temo

Cantem minhas proezas, e sejam elas lendárias e dignas de ouvir
Cantem celebrando: esta guerra está ganha, viva o fim
Eu me ergo em desafio, e mostro a todos o valor dos paladinos

E para cada mão que fere, para cada cria dessas trevas:
Encontrem-me no caminho. Pois, eu sou o escudo, eu sou o caminho de pedras que terão que atravessar e só passarão se meu sangue estiver frio. Eu sou a torre de sentinela, a longa muralha. Indestrutível! Eu sou...

Como meu pai queria...

Os que temem e se desesperam, aguardam a minha chegada
Mas, não quero lutar (ao menos, não de novo, não de novo)
Quero a paz que prometo aos demais, quero essa paz
Queria ver o sol, e correr e brincar e rir (Mas, não sou mais criança)

Não há mais paz, nem pais, nem pai, só comandante
E voz de comando me assombra a todas as horas
(Força! Coragem! Lute!)
Onde está o sol de que tanto escutei falar?

TUM! Soem os tambores! A guerra se aproxima!
TUM! Dancem as espadas (Elas só sabem matar)
TUM! Dancem! TUM-TUM! Cantem! TUM! Lutem! TUM-TUM! Durmam!
TUMMM! Mas, se lembrem, que na manhã seguinte vocês não verão o sol...
(E como eu poderia esquecer?)

“Seja forte, meu filho. Estas terras não têm pena de ninguém”
Nem pena de mim, meu pai? Apenas um homem...
Tenho os mesmos medos dos demais, as mesmas dúvidas. As mesmas incapacidades, o mesmo cansaço, a mesma desmotivação, a mesma fome, o mesmo frio, a mesma insônia, pelos mesmos pesadelos. A mesma vontade de fugir para sempre da escuridão destas terras!
Mas, não vou. Muitos precisam de mim, como eu preciso de todos eles. E, no final das contas: Não teria me feito diferente, pai.

Aos que temem e se desesperam: “Aguardem a minha chegada. Não deixarei vocês sozinhos.”

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“Piedade”:

Mãe, mãe, onde está? Não a vejo...
A perdi quando estava ainda no berço.
Tenho dela somente o desejo e último beijo,
Que ganhei e, ainda que pequeno, com carinho eu lembro,
Mas saudade, não nego, eu tenho, e um dia a verei novamente...

Meu irmão, minha força e apoio
Neste dias escuros, com ele eu conto
E conto a ele de tudo, como contaria à mãe
Até o dia de sombras (todos os dias em sombras)
Quando veneno guiou mão em ódio e matou o que foi minha luz

Sangre, morra! Eu sou o seu salvador e acusador!
Sou o juiz e executor! Sou seu nêmesis!
E, daqui em diante, de todos...

“Deixe ser eu o sol”

Derramando sangue por sangue
Mesmo que viva pra sempre em andança
Sempre caçado, sempre caçando, cubro a distância,
Pois, que distância poderia me separar de minha casa?
Mesmo sem vê-la, sei que está lá, a me esperar, com flores e um lago.
Um jardim, um quintal, onde brinco com os meus filhos, e depois os deito
Em camas seguras, onde eles dormem o sono tranqüilo das crianças pequenas
Pois passaram o dia todo correndo e rindo, e, em tudo, no dia, aproveitando a infância.

Esta estrada de tijolos vermelhos,
A sinto em meus pés, que já não podem mais.
Mas, não podem parar, pois não tenho opção.
“Que pesada esta carga que temos que carregar...”
Porque não vejo minha casa à frente?

“Lembro de tê-la visto dançando e sorrindo”
E, naquele sorriso, eu vi o futuro que tínhamos, juntos
Sorriso tão lindo que queria guardá-lo para sempre no tempo
Mas, de noites em noites, a vejo chorando, e não sei como trazer seu sorriso de volta.
“Queria dar a ela apenas um amanhecer, e um céu de paz”

“Você sabe que estas terras não guardam esses bons dias”
E, ainda, elas me dão liberdade para sonhar, pois
A noite, ainda em dias de medo e pouca esperança
Ainda é a casa dos sonhadores, e, sonhadores que são, eles acreditam no futuro
E, eu também acredito, por ondas e ondas que me atinjam, nessas marés de tristeza

Queria saber como é o sol de que tanto ouvi falar.
“Vocês pouco sabem que não existe nenhum sol no futuro”
Queria poder viver bem, e estar mais com ela
Capitão! Precisamos de ajuda!
“Eu sou o eclipse, e anunciei esta escuridão”
Queria ter tido outras chances, queria tentar de novo...

sexta-feira, outubro 13, 2006

Tin Man (as 6 partes)

Tin Man (1)
Mãos culpadas suam no cabo de metal áspero da forja. Metal negro esquenta o ambiente ao redor, sob a ação de fogo. Faíscas saltam para todos os lados, iluminando suavemente o espaço vazio ao redor, e o metal grita o impacto. A cada batida a espinha de aço se contorce, criando forma, atraindo olhares.
Olhares pesados, de rostos pouco amistosos, cortam o ar, agressivos. Como se essa agressividade pudesse protegê-los da culpa. Mas, ainda, já sentem pequenos cortes de karma em suas almas. Magias proibidas, conhecimentos ocultados por medo e anos. O mesmo medo de anos anteriores percorre as veias de cada um dos homens daquele dia e lugar, e os bebe a energia.
Os demorados e exaustivos rituais os consomem, e consomem o metal, que não é mais metal, mas vida. E, mais do que vida, morte. Também para os criadores da besta, de coração oco, e de olhar vazio. Mãos de ferro e aço que partem ossos e rasgam carne, e se tingem de vermelho. Passos que quebram o chão de pedra seguem. Um...Um...Um...Um...O boneco vermelho faz seu caminho para longe da forjaria, e para o campo aberto.
O sol se esconde, para não ver os horrores que o homem de metal irá trazer por onde passar. O dia se torna (lentamente) nublado, triste e frio. A areia sob os pés da aberração parece se afastar, assustada, a cada vez que eles tocam o chão. Os olhos mortos da criatura, opacos, percorrem toda aquela imensidão vazia, e ela caminha. Sem direção. Um erro errante. Amoral, imoral, de sangue frio. A luz pálida daquele dia triste causa arrepios sem motivo em muitas pessoas mais sensíveis. ‘Começou...’
Tin Man (2)
Por quilômetros a besta caminha, e caminha, incansável. Até que pára, ao ver um belo lago de águas paradas e claras (agora tão escuras sob aquelas nuvens). A bela paisagem verde que a cerca, e as montanhas do horizonte, tomam a atenção do homem de metal. E, se a criatura tivesse um fôlego, estaria sem ele. Desconhecia a beleza.
Subitamente, risadas, de uma voz fina, infantil. E, dos arbustos, uma menina surge, correndo, sozinha, rindo, com uma flor roxa em sua mão. Surge, para, assustada, parar exatamente onde está, olhando o homem de metal, assombrada. O homem de metal nada faz, senão observar a menina, talvez igualmente surpreso. Instantes passam, e o susto inicial da menina se torna mero estranhamento, e curiosidade. Ela começa a se aproximar da criatura, com passos curtinhos, em teste, e ele parece tremer suavemente com o primeiro movimento inesperado da menina.
Quando já está suficientemente próxima, a menina estica sua mão, para entregar a flor que carrega ao homem de metal. Ele, atônito, a observa por alguns momentos. Até que, lentamente, começa a mover seu braço, pouco a pouco, de centímetro em centímetro, encurtando a distância que separa os dois. Move seu braço até que as pontas de seus dedos começam a tocar suavemente as pétalas roxas da flor.
E, então, num movimento brusco, e violento, agarra a menina pela mão, e a puxa em sua direção, para quebrar o seu pescoço, e soltar seu corpo amolecido ao chão. O corpo da menina cai, rolando lentamente pela margem, para então parar parcialmente mergulhado nas águas daquele lago.
Os olhos opacos, negros, do homem de metal ficam a observar a menina, e quem olhasse de fora diria que a criatura estava triste, e que ficou ali por muito tempo, antes de novamente voltar a caminhar. Passo...Passo...Passo...Passo...
Tin Man (3)
Massacres, muitos, antes de pôr-do-sol. Correm boatos da criatura, e correm para longe todos os que podem deixam aquelas terras para não retornar. Todos os que podem. Mas, há aqueles que não tem essas condições.
De dentro de uma casa velha, um senhor de idade, velho e doente, deitado em sua casa, deixado para trás por sua família, aguarda sozinho a chegada de um pesadelo de metal. E, o som de passos que se aproximam em pequenos tremores logo surge de além das janelas fechadas daquele quarto-asilo:
Passo...Passo...Passo...Passo...Bate o coração do homem, que começa a chorar, ofegante, ao ver a silhueta em sombras da criatura passar do outro lado de sua janela fechada. Através daquelas cortinas sujas e empoeiradas, que um dia foram brancas, ele vê sua própria morte. Passo...Passo...Passo...E a estrutura de madeira da casa treme a cada avanço da monstruosidade. Aumentando sua força, mais próximo, chegando...Até a porta aberta do quarto.
Os mesmos olhos mortos, frios, da besta de metal que já havia encerrado dolorosamente muitas vidas desde que a sua própria lhe fora dada, agora fitavam o velho moribundo. Velho ofegante, velho moribundo, velho morrendo...Tremia agora, e babava, em um intenso momento de convulsões e pânico. Logo, seu coração parou.
A criatura o observou, apenas. Seu corpo metálico ainda avermelhado do sangue seco de outras de suas vítimas. Seus olhos tão vazios. Sem coração. Passo...Passo...Passo...Outras casas no caminho.
Tin Man (4)
As notícias viajam com o pânico das pessoas, junto delas, de casa em casa, de hospedaria em hospedaria, de taverna e taverna, até uma específica. E, nesta taverna, um homem quebrado, cansado, que bebia para esquecer muitas das coisas pelas quais ele passara. Um homem para quem a notícia trazia sobriedade.
Passos, passos, passos, passos, e apressadamente o homem seguia na direção oposta daquelas pessoas. Um homem que sabe o que deve ser feito. Um pobre homem, cansado, quebrado, carregando o mundo nas costas. Um homem velho, um bruxo velho, que um dia fora como os criadores da monstruosidade, e a quem os pecados sempre retornavam para perseguir.
Passos, passos, passos, e o bruxo, agitado, seguia ao encontro do pesadelo de metal. Desespero interno, e senso de dever. Talvez, assim, os fantasmas não o perseguissem mais para longe de suas noites de sono e descanso. Um homem sem paz.
Rostos de pessoas comuns, muito choro, muitos passos para longe de casa. A estrada, sob uma garoa fina e fria, tinha registro da passagem de cada um deles. E, muito distante de onde eles estavam, ela também sentia os passos pesados de pés de ferro. Muito distante, mas a caminho...
Tin Man (5)
No encalço da criatura, a perdendo sempre por horas, o bruxo encontra sempre apenas a tragédia e a dor, que aumenta a sua. Ele também está morrendo, de um mal que o seca e consome por dentro. Ele tosse sangue, morno, diferente do que encontra derramado ao chão de seu caminho.
Subitamente, escuta outra tosse, que não a sua própria. Esta muito fraca, quase desaparecendo, vinda de próximo dali. O bruxo avança em busca da origem da voz, e a encontra em meio a uma casa de madeira quebrada em pedaços. Ele levanta uma de suas tábuas, para encontrar uma moça do campo, chorando sozinha.
Morria sozinha, mas não mais. O bruxo segura sua mão, e observa enquanto os olhos da jovem buscam ao redor por alguma coisa. Ele sabe que ela está a procura do bebê que ele viu jogado na chuva e lama, do lado de fora. Pequenas costelas quebradas por mãos de ferro. Os olhos dos dois são iguais, mas os dela ainda têm algum suave brilho.
- Seu bebê está bem. Não se preocupe.
Ela aperta sua mão com força: queria apenas isto. E, agora que pode estar em paz, seu corpo não resiste muito mais. A dor começa a lhe tomar conta, e o bruxo a ajuda a fazer a transição. Sua própria dor o teria mantido ali por algum tempo, mas ele pôde escutar, vindos de fora, os pequenos tremores:
Passo...Passo...Passo...
Tin Man (6)
O bruxo caminha para fora, do que ainda parecia ter sido uma casa. A chuva lavou muito do sangue que cobria a criatura. Ela está como quando nasceu: apenas corpo de metal. Os olhos vazios, ainda, observam silenciosamente o homem. E, o bruxo, tosse, já também quase no fim de suas forças.
O golem pode ser criado apenas com um sacrifício, e deve morrer apenas com um sacrifício. Uma vida por uma vida. O bruxo caminha em direção ao enorme monstro metálico. O monstro caminha de volta. Eles se encontram no caminho, e pela vontade e magia do bruxo, ambos caem, quando ele toca o peito da criatura e pronuncia palavras em línguas ocultas.
Jogados na lama, sem mais o movimento de seus corpos, eles ainda podem se olhar, face a face, enquanto fazem a transição. Os olhos vazios da besta agora parecem pedir ajuda. Apenas uma criança, que não quer morrer. Apenas uma criança que sabia apenas matar. Talvez, ela tivesse brincado em feito amigos, mas ela foi feita com ódio. E, se livrou dele, agora na morte.
A paz vem para os dois, com um último fôlego gêmeo, quando eles partem juntos para o outro lado. Apenas dois condenados, que agora podem descansar. Talvez eles sejam amigos, cada um de seu libertador.