quarta-feira, março 19, 2008

Coca-colas no asfalto

(Manobras literárias sobre juventude perdida)

- Esses garotos, sempre correndo por aí, aprontando. Hunf! – dizia a mulher, pendurando suas roupas, e os olhando por sobre a cerca

Eram quatro, e sempre corriam, iam e vinham, davam risadas, e, sim, aprontavam das suas. Mas, afinal, era um subúrbio pacato demais, e eles eram garotos demais para se comportar. Corriam para o half. “Corriam”, quer dizer: iam sobre skates, não saiam de cima deles.

Os garotos mais velhos, eles é que eram legais. Estavam todos ali, fazendo suas manobras, se divertindo. Ah, lindas garotas.

- Por que a meninas da classe não podem ser assim? – perguntou Beto

Suspiraram. Vitor disse:

- Ah, essas são mulheres. Um dia, as nossas também vão ser assim. – tomou um gole de sua Coca

Todos tomaram um gole das suas próprias. Suspiraram novamente. André e Carlos apontaram para um dos garotos mais velhos, que se aproximavam, deslizando sobre o chão.

- E aí, vocês vêm aqui só pra olhar, ou qual é? Esses skates são pra quê?

- Ei, cara, nós andamos muito, e você nem sabe. – respondeu o Beto

- É. – disse, Vitor

O garoto mais velho começou a rir, assim como alguns dos demais do grupo, que se aproximava. Disse:

- Ah, é, “cara”? “Irado!”

- Mostra pra gente. – disse uma das garotas (Suspiraram.)

Estavam convencidos. Beto e Vitor colocaram seus refrigerantes no chão, ergueram seus skates e correram para o half. André e Carlos apenas os observaram.

Daquele ponto em diante, tudo mudou. Beto e Vitor pararam de andar com André e Carlos: eles eram apenas moleques. Alguns anos depois, Beto começou a usar drogas, e terminou atropelado, bêbado, na rua. Vitor foi baleado, fugindo da polícia após alguns atos de violência da gangue à qual fazia parte.

Beto roubara dinheiro de André, certa vez. Trocaram socos, foram separados, e a amizade acabou por ali. Carlos ficara do lado do amigo de sempre: sempre foram mais parecidos que os demais. Apenas que, sozinhos, não eram mais como antes.

- Esses garotos... Nunca mais foram garotos, nunca mais brincaram por aí. – apenas pensava a mulher, pendurando suas roupas, olhando para André e Carlos, caminhando por aí

Ficaram apenas as Coca-Colas no asfalto, e aquela época para trás. Não eram mais garotos.



p.s. – Para outra abordagem ao mesmo tema, visitem:

http://sickbastards.blogspot.com/


Um comentário:

Henrique Monteiro disse...

O que mais me agradou no texto foi o começo e o final.
Que volta na mulher...
Antes falando, depois pensando...