quinta-feira, novembro 01, 2007

Psicose (2/3)

Passo, degrau, perna, passo, degrau, perna, arma preparada. O homem sentia seu coração palpitar rapidamente, tão rapidamente quanto sabia que teria que agir. O perigo era iminente, e tudo dependia de seus reflexos. Respirava controladamente, como havia sido ensinado em seu treinamento. Droga! Tudo parecia ter sido há tanto tempo atrás! Nem sabia se lembraria de tudo, e precisava de tudo que pudesse usar agora. Estava sozinho, e não havia tempo de esperar seu parceiro, nem mesmo reforços. Cada segundo contava agora, e as vidas e muitas pessoas dependiam dele. O assassino não faria mais vítimas, não podia, não se ele podia pará-lo. Prosseguia...


Cada degrau parecia lhe parecer uma colina, e com cada passo que dava seu fôlego encurtava. Apoiou-se contra a parede: dor! Seu peito parecia que iria rasgar, e a dor se alongava até seu braço. Sempre teve problemas cardíacos, mas havia conseguido ocultá-los no exame físico para a polícia. Agora não era a hora de parar. Cerrou seus dentes e continuou, em silêncio, até tombar em meio à escada. Tontura. O mundo se movia como um barco solto às ondas, as paredes pareciam soltas e se moviam. Tentava respirar. Estava quase no segundo andar a casa, mas agora sua respiração e gemidos de dor certamente já haviam revelado sua posição. Podia ver aquela porta naquele corredor escuro, podia ver a luz que vinha de suas frestas, pôde ver a silhueta do homem o observando, mesmo com seus olhos ameaçando se fechar.


Em um esforço como poucas vezes fizera em sua vida, tentava erguer sua arma em direção ao homem, mas as dores lhe aumentavam. Assassino! Assassino! O homem que matara sua esposa, sua garota, a única mulher que jamais havia amado em sua vida, à sua frente. E ele estava impotente: sequer conseguia apertar um gatilho. A cena de quando entrara em sua casa a quase um ano, voltando do trabalho, lhe vinha à mente. A cena de seu quarto, da cama que dividiam, do sangue. A cabeça de sua esposa, jogada sobre seus lençóis. O bilhete, com aquelas palavras horríveis. Começou a chorar.


Lentamente, o homem caminhou lentamente até ele, mas quase não o via, senão uma silhueta. Podia ouvir seus passos, sentia os passos do homem tremendo as tábuas do chão de madeira, sentia a dor de seu coração que parava. Precisava parar aquele homem. Continuava tentando, mas não importava o quanto quisesse, seu corpo já cedia. O homem se agachou próximo a ele, e disse:

- Você não acha que isso está se tornando cansativo?

O detetive não conseguiu dizer palavra alguma, e nem teria desperdiçado palavras com aquele animal. A presença daquele homem ao seu lado, e o fato de não poder matá-lo, como gostaria, ou mesmo prendê-lo, tirá-lo das ruas para sempre, agravavam sua condição. Quase não conseguia mais respirar, engasgava com o ar.


O homem riu da situação do detetive, e tirou a arma de sua mão, lentamente. Disse:


- Boa sorte com a sua morte, detetive. Que ela seja menos agonizante que a de sua esposa. – então aproximou sua boca do ouvido do detetive e disse – Você nunca vai achar o corpo dela, você nunca vai ter essa paz. O que irão achar, porém, são evidências, em sua nova casa, de que você foi o culpado, o assassino. Você vai perder sua honra, o nome do seu pai, e eu vou continuar livre, bem como eu bem quiser.


Aquele monstro se levantou e seguiu escada abaixo, levando a arma do detetive, que sentia um frio tomar seu corpo...


Não! Não, não não! Por Carla, ele não iria morrer naquele lugar, ou daquele jeito. Achou forças, concentrou-se, decidiu-se a viver. E, pouco a pouco sua pulsação voltava, as dores diminuíam, embora ainda persistissem. Passou a mão em seu rosto: suara muito, frio. Ainda estava tonto, mas precisava achar um meio de seguir o assassino de sua esposa até sua nova casa. Havia vendido a antiga, pois jamais conseguiria morar lá novamente. Ligou para seu parceiro e lhe deu as novas direções, gaguejando, ofegante.


Olhou na direção da porta entreaberta do quarto do segundo andar, e pôde ver as manchas de sangue, em meio ao silêncio que imperava na casa. ‘Descansem em paz’, pensou, e não ousou chegar mais próximo dali. Deixou a tarefa para seus companheiros. Não agüentaria entrar em mais um cenário de vítimas e sangue, não agora. Apenas, correu aos tropeços, e apoiado contra a parede, escada abaixo, e para fora daquela casa. Corria, agora, para sua própria.

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